publicado: Revista Fórum
O jogo Grêmio e Santos, no dia 28 de agosto, no Estádio Olímpico, foi palco de mais uma manifestação racista. Desta vez, a vítima foi o goleiro santista Aranha, chamado de “macaco” e “preto fedido” por torcedores gremistas na partida vencida pelo alvinegro praiano por 2 a 0.
O episódio aconteceu no final da partida, aos 43 minutos do segundo tempo. Assisti ao VT da partida. O Santos fez dois a zero no primeiro tempo e depois segurou o resultado. Aranha foi um dos jogadores mais importantes nesta vitória, pois no segundo tempo, só deu Grêmio. Algumas defesas do goleiro santista foram fundamentais para o resultado positivo.
Por que estou dizendo isto? Justamente pelo fato do racismo sempre se apresentar como uma “reserva argumentativa” em situações como esta. O lema de “vencer a qualquer custo” impregnado nos torcedores e até jogadores e técnicos – que, inclusive, incentiva a violência generalizada nos estádios e fora deles – traz consigo o racismo, o machismo e a homofobia como comportamentos frequentes. E acontecem simplesmente porque o racismo, o machismo e a homofobia estão impregnados na sociedade brasileira. Ainda que tenha se avançado nas políticas de combate a estes mecanismos, eles ainda persistem no imaginário.
Na defesa de uma orientanda minha de doutorado na Pós Graduação em Direitos Humanos da USP, o meu amigo professor Salvador Sandoval, da PUC/SP, estudioso dos mecanismos de opressão e autoritarismo social, disse que as normas legais podem coibir comportamentos mas não pensamentos.
É aí que quero meter a minha contribuição neste debate, para irmos além da justíssima indignação que muitos tiveram contra este episódio. Existe impregnado na sociedade brasileira pensamentos autoritários, em especial o racismo e o machismo, principalmente porque estes sustentam hierarquias sociais. Para a torcedora branca gremista Patrícia Moreira, flagrada no ato racista nas arquibancadas da Arena Grêmio, “como um negro ousa atrapalhar a vitória do meu time?” Assim, como os casos de racismo contra estudantes negros que ingressam nas universidades por meio de ações afirmativas, “como ousam querer dividir um espaço que é só meu?”.
Por isto, embora sejam importantes os mecanismos institucionais de punição ao racismo e inserção de afrodescendentes, eles não são suficientes por si só para coibir o racismo. O mesmo ocorre com o machismo. Isto porque são ideologias que sustentam uma determinada forma de relação social. E as ideologias se realizam nas práticas cotidianas. Daí a necessidade de se denunciar, de ser vigilante, de apontar o dedo quando expressões, comportamentos, falas, atitudes denotam racismo (e também machismo e homofobia). Não se trata de impor a ditadura do politicamente correto, mas de combater o politicamente facista (emprestando uma fala do escritor Marcelo Rubens Paiva).
Neste sentido, fez bem Aranha indignar-se e denunciar o episódio. Ir até o fim com isto, independente da morosidade da Justiça ou da má vontade dos cartolas do futebol. Não apenas para punir os torcedores, mas principalmente como papel pedagógico, de cutucar e fazer refletir que em uma sociedade justa, pessoas que tenham tais comportamentos não fazem sentido.
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