quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Vítima de racismo Rafaela Silva conquista primeira medalha de ouro feminina do judô brasileiro

Mesmo após as críticas, a judoca fez questão de comemorar o título mundial junto com a torcida brasileira
Vítima de racismo após a eliminação na Olimpíada de Londres, a judoca Rafaela Silva conquistou a primeira medalha de ouro feminina do judô brasileiro em mundiais em uma data especial na luta por uma sociedade mais justa: o aniversário de 50 anos da Marcha sobre Washington, comandada por Martin Luther King.
Marcada pelo histórico discurso do líder negro americano conhecido pela expressão "I have a dream" ("Eu tenho um sonho"), a caminhada com mais cerca de 250 mil pessoas foi decisiva para o fim da segregação racial nos Estados Unidos. A conquista de um título inédito numa data tão especial foi exaltada por Rafaela.



"É um momento especial [o aniversário da Marcha sobre Washington]. O próprio judô mostra que o racismo não tem o menor motivo", disse Rafaela ao UOL Esporte. Emocionada, a mãe da judoca também condenou as ofensas sofridas no ano passado.
"A gente ficou muito triste na época. Até queriam que ela entrasse com um processo contra aqueles que a ofenderam, mas disse para a Rafaela para não levar isso adiante", lembrou.
A judoca citou o próprio judô como exemplo para a sociedade. Segundo ela, o esporte é democrático e não faz distinções em função da cor da pele.


"O esporte foi criado por japoneses e o maior ídolo é um francês negro [Teddy Riner]. É um esporte democrático, assim como a sociedade deve ser", exaltou Rafaela Silva, natural da Cidade de Deus, famosa favela do Rio de Janeiro.
Citado por Rafaela, o francês Teddy Riner é o maior nome do judô da atualidade. Ele é pentacampeão mundial e ouro olímpico, além de uma verdadeira estrela em sua terra natal. O europeu disputará a categoria peso pesado (acima de 100kg) no Rio de Janeiro no sábado.
Já a polêmica que causou insultos racistas a Rafaela após a sua participação na Olimpíada de Londres se deu por conta do uso pela judoca de um golpe proibido pelas novas regras do judô, a catada de perna. A carioca foi desclassificada da competição e, posteriormente, ofendida por usuários de redes sociais.
Fonte:uol.com.br

SBT mostra esquema de médicos fantasmas na rede pública



As reportagens exibidas nesta semana pelo SBT Brasil que mostra médicos saindo do Hospital Estadual Roberto Chabo, em Araruama (RJ), logo após baterem o ponto, provocou a exoneração do secretário de Saúde do município, José Gomes de Carvalho, nesta quarta-feira (28). Carvalho também fazia parte do esquema de "médicos fantasmas" e chegou a parar com o carro na calçada para assinar o ponto e ir embora.

Um médico que já trabalha no hospital há oito anos e não quis se identificar afirmou durante entrevista à emissora que o diretor do hospital também está envolvido no esquema. "Há médicos que recebem e repassam uma parte para o diretor, há médicos que recebem porque são apadrinhados políticos", afirmou.

Procurado pela reportagem do noticiário, o diretor do hospital, Carlos Alberto Peixoto Figueiredo Júnior, não quis comentar o assunto. Segundo o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, ele tem cinco empregos, além do cargo de diretor, e trabalha 90 horas por semana.

A médica Valéria Cristina Ferreira também aparece na reportagem pensando em como sair do hospital e escapar do repórter após bater o ponto. "Eles estão nos dois portões. Sabem quem está vindo só para marcar o dedo. Ela tem dois empregos na unidade e é coordenadora da UPA (Unidade de Pronto-Atendimento) de Araruama. De acordo com o SBT Brasil, ela foi afastada do cargo.

Outros "médicos fantasmas" citaram que algumas especialidades tinham esquema de sobreaviso e
confirmaram que o diretor sabia de tudo. Um deles foi Benevuto de Mesquita Soares, que apareceu na primeira reportagem exibida pelo canal. "Foi a forma que eu fui contratado. Seria estranho ficar aqui três neurocirurgiões, tres cirugiões e três anestesitas esperando os pacientes chegarem", declarou.

A Secretaria de Estado da Saúde do Rio de Janeiro, após a exibição da primeira parte da reportagem, na segunda-feira (26), já havia afirmado que foi aberta uma sindicância por parte da Subsecretaria e Corregedoria da Saúde para investigar o caso.

De acordo com a secretaria, os nomes dos médicos envolvidos na fraude serão enviados ao Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj) para que a entidade investigue a conduta médica desses profissionais.

Caso seja comprovada a fraude, os médicos poderão ser demitidos e a Secretaria solicitará que a Procuradoria Geral do Estado entre com medidas judiciais cabíveis para que haja o ressarcimento desse dinheiro pago aos profissionais que não trabalharam.

De acordo com a reportagem do SBT, o hospital é utilizado por moradores de 11 cidades da Região dos Lagos, que têm juntas 770 mil habitantes.

Em junho, o SBT Brasil denunciou que médicos da maternidade pública Leonor Mendes de Barros, na zona leste de São Paulo, agiam da mesma forma.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

O médico cubano negro e a intolerância da nossa elite branca

publicado: blog do Rovai


A foto que está circulando hoje pela internet de um médico negro de Cuba sendo vaiado por jovens brancas de jaleco branco em Fortaleza é ilustrativa do significado da insana luta a que se dispuseram muitos de nossos doutores. Eles não estão lutando pela saúde da população, mas pelos seus interesses mais mesquinhos. E por isso não aceitam que um negrão cubano, que se brasileiro fosse serviria pra catar suas latas de lixo num caminhão de coleta ou ainda carregar fardos de carga num armazém, venha para o Brasil ocupar um espaço que, inclusive, ele não deseja.
Boa parte da argumentação dos médicos que têm radicalizado no discurso xenófobo contra os que aceitaram trabalhar nos cantões do Brasil é a de que eles estudaram muito para conseguir passar num vestibular. E que os estrangeiros não. Que eles pagaram caro pelo curso. E que os estrangeiros não. Que eles investiram na carreira para ter retorno futuro. E que com a vinda dos estrangeiros isso está em risco. Este argumento final é o verdadeiro x da questão. Boa parte dos nossos médicos decidiram ser médicos para permanecer num patamar restrito da elite. Mas talvez não se deem conta de que esse corporativismo é a base da morte de milhares de brasileiros pobres e miseráveis.


Eles não são contra apenas os médicos estrangeiros ou de Cuba, mais especificamente. Eles também são contra a criação de novas faculdades de medicina. Os conselhos vivem desqualificando as iniciativas do governo pra criar novos cursos.


Ou seja, a foto que está ilustrando este post é significativa para pensar o país que queremos. Se queremos um Brasil da inclusão, onde seja algo normal ser atendido por médicos negros que não sejam cubanos. Se queremos um Brasil onde estrangeiros sejam recebidos com respeito. Se queremos um Brasil onde saúde seja um direito de todos. Ou se preferimos viver num país de brancos de jalecos brancos que exigem ser chamado de doutores exatamente porque se acham acima daqueles que deveriam tratar com respeito e dignidade.
O interesse de uma corporação não pode estar acima dos interesses de toda a sociedade. E os médicos que estão nas ruas vaiando os seus colegas cubanos nunca estiveram nas ruas lutando por melhorias na área da saúde. Os que estiveram e estão nesta luta por um sistema único de qualidade, por exemplo, não se dignam a participar de um papelão desses.
Essa foto fica pra história, como a daquelas dos navios negreiros. Mas neste caso, pelo seu inverso. Porque negros de Cuba aceitaram vir pra cá contribuir pra melhorar a vida de outros negros e brancos pobres. E foram açoitados pelas vaias de brancos e brancas que se lixam pra vida dessa enorme parcela da população. Porque eles são da Casa Grande. E a Casa Grande sempre se locupletou com a péssima qualidade de vida da senzala.




cubanos, Mais Médicos

Jornalista afirma que médicas de Cuba “têm cara de empregada doméstica”

Micheline Borges lamentou a chegada dos profissionais ao Brasil e disse: “Coitada da nossa população”
Publicado: www.revista Fórum.com.br
Por Igor Carvalho

Micheline Borges se manifestou pelo Facebook (Imagem: Reprodução Facebook)

Micheline Borges, uma jornalista potiguar, causou revolta nas redes sociais ao expressar sua opinião sobre os médicos cubanos que estão chegando ao Brasil para trabalhar no programa “Mais Médicos”. “Me perdoem se for preconceito, mas essas médicas cubanas tem uma cara de empregada doméstica”, afirmou a repórter.
Em outro trecho, ela reclama da imagem dos profissionais cubanos. “Médico, geralmente, tem postura, tem cara de médico, se impõe a partir da aparência”.
A jornalista chega a questionar se os médicos de fato são profissionalizados, por conta da aparência deles, e questionou se eles serão capazes de tratar dengue ou febre amarela. Micheline Borges termina desejando que “Deus proteja o nosso povo.”
A jornalista deletou sua conta no Facebook após a repercussão negativa de suas declarações. O tom preconceituoso do texto fez com que quase mil pessoas compartilhassem a imagem na rede social, com tons ofensivos, acusando Micheline de racismo.

Médicos estrangeiros foram hostilizados e chamados de escravos por médicos brasileiros


A foto acima diz tudo; um médico cubano negro, que chegou ao Brasil para trabalhar em um dos 701 municípios que não atraíram o interesse de nenhum profissional brasileiro, foi hostilizado e vaiado por jovens médicas brasileiras; com quem a população fica: com quem se sacrifica e vai aos rincões para salvar vidas ou com uma classe que lhe nega apoio?

Fonte: blog do Esmael

Em nenhum país do mundo, os médicos cubanos estão sendo tratados como no Brasil. Aqui, são chamados de “escravos” por colunistas da imprensa brasileira (leia mais aqui) e hostilizados por médicos tupiniquins, como se estivessem roubando seus empregos e suas oportunidades. Foi o que aconteceu ontem em Fortaleza, quando o médico cubano negro foi cercado e vaiado por jovens profissionais brasileiras.

Detalhe: os cubanos, assim como os demais profissionais estrangeiros, irão atuar nos 701 municípios que não atraíram o interesse de nenhum médico brasileiro, a despeito da bolsa de R$ 10 mil oferecida pelo governo brasileiro. Ou seja: não estão tirando oportunidades de ninguém. Mas, ainda assim, são hostilizadas por uma classe que, com suas atitudes, destrói a própria imagem. Preocupado com a tensão e com as ameaças dos médicos, o ministro Alexandre Padilha avisou ontem que o “Brasil não vai tolerar a xenofobia”

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Médicos não querem morar em 74 cidades no Paraná

Fotos: Cesar Machado / Agrostock / Vista do hospital de Lindoeste. Na cidade paranaense, cenário é típico: médicos precisam vir de cidades vizinhas
publicado: Gazeta do Povo -26/08/2013

Um total de 74 municípios do Paraná não tem médicos residentes. Profissionais que os atendem enfrentam estradas de chão e rotina estressante, mas resistem em morar nas cidades muito pequenas.
Marquinho tem 19 anos e nunca conseguiu atrair um doutor – ou doutora. O caso pode parecer irrelevante, mas é exemplo de um cenário preocupante. Assim como Marquinho, no Centro-Oeste do Paraná, outras 73 cidades do estado, algo como uma a cada cinco do total de 399 municípios, não têm médicos residentes. Os dados são do Conselho Regional de Medicina (CRM-PR).
Essas informações se referem apenas aos endereços dos profissionais inscritos no CRM-PR. Outra fonte, o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde do Brasil (CNES), aponta que, até julho, 34 cidades do Paraná não tinham vínculo com profissionais do SUS. Mesmo com possíveis falhas cadastrais, os dois bancos de dados comprovam a existência de um “apagão” de profissionais em pequenas cidades do interior.
A situação não é nova. Pesquisa feita em 2008 pela Gazeta do Povo, a partir das informações do CRM-PR, revelou que 89 municípios paranaenses não tinham médicos residentes. O CNES mostrava que 33 cidades não tinham profissionais do SUS.
Da lista atual de 74 municípios sem profissionais residentes, 49 (66%) se inscreveram na primeira chamada do Mais Médicos, iniciativa do governo federal para preencher mais de 15 mil vagas em unidades de saúde. Apenas quatro foram classificadas como prioritárias, devido à vulnerabilidade social. São elas Doutor Ulysses, Mercedes, Nova Laranjeiras e Tunas do Paraná.
Na semana passada, ao anunciar o acordo para trazer 4 mil médicos cubanos pelo programa, o Ministério da Saúde informou que a primeira leva desses estrangeiros vai ser destinada aos 701 municípios que não estiveram entre nenhuma das seis opções de cada um dos 1.618 profissionais inscritos na primeira chamada. Dessas cidades que passaram a ter preferência, cinco ficam no Paraná. Novamente Tunas aparece na lista.
“Só mesmo atraindo estrangeiros para a situação mudar”, avalia Maria Accordi, secretária de Saúde de Marquinho. Na falta de profissionais que queiram morar na cidade de 4.983 habitantes, ela precisou importar dois clínicos gerais que residem em Laranjeiras do Sul, a 46 quilômetros. Uma delas é boliviana, com CRM brasileiro.
Medicina passa pela estrada de chão
Maria Gizele da Silva, da sucursal
Uma saída para que cidades afastadas tenham médicos é a viagem diária, o chamado “bate e volta”, praticado por profissionais que trabalham em vários lugares. Não é raro terem de pousar em quartos improvisados de postos de saúde e hospitais.
Tunas do Paraná fica a 90 quilômetros de Curitiba. Quatro médicos que moram na capital fazem o trajeto diário até ali. O salário médio é de R$ 15 mil, mas não incentiva os profissionais a morarem na cidade. A remuneração é similar à paga em Doutor Ulysses, também na região metropolitana. Três médicos pernoitam, de segunda a sexta-feira, mas o motivo da permanência é de ordem estrutural: melhor dormir em Doutor Ulysses do que enfrentar 50 quilômetros de estrada de chão antes de chegar ao asfalto que leva a Curitiba.
Rotinas de pernoites e longas estradas são comuns em todo o Paraná. Cinco médicos que moram em Laranjeiras do Sul, no Sudoeste, vão e voltam todos os dias de Porto Barreiro, a 18 quilômetros. O salário médio é de R$ 10 mil. O tamanho da cidade, contudo, não atrai. “Porto Barreiro não tem um colégio particular onde o médico possa colocar seu filho”, observa o secretário de Saúde, Anderson Alberto Marangoni.
O vaivém é tão cansativo quanto perigoso. Telêmaco Borba, nos Campos Gerais, não está na lista dos municípios sem médicos fixos, mas também depende de profissionais que residem fora. No início de agosto, o médico Orlando Mayer, 67 anos, viajava de São Mateus do Sul para Telêmaco Borba para cumprir plantão quando sofreu um acidente na estrada e morreu.
Em Conselheiro Mayrinck, Norte Pioneiro, a situação é melhor, em termos. Os dois médicos que trabalham ali recebem entre R$ 25 mil e R$ 30 mil para atuar no hospital, no posto de saúde e no centro da mulher. A cidade se cadastrou no programa Mais Médicos e foi contemplada. O secretário de Saúde, Sidnei Silva de Lima, diz que a vinda dos profissionais será um alívio. Dos dois médicos que atendem no município, um mora em Ibaiti, e outro vai se aposentar em outubro.
Política do “quem dá mais” inflaciona salários
O presidente da Associação dos Municípios do Paraná (AMP), Luiz Sorvos, afirma que a escassez de médicos em pequenas cidades inflacionou os salários pagos pelas prefeituras. A média de gasto por profissional nesses locais está entre R$ 20 e R$ 22 mil – mais que o dobro da bolsa oferecida pelo governo federal.
“Não há alternativa. Tem de pagar. Do contrário, outro prefeito vai lá e paga”, diz Sorvos, para quem o principal benefício da chegada dos estrangeiros será o início de um processo de adequação salarial.
Enquanto isso, os prefeitos fazem ginástica para garantir as contratações. Em Lindoeste, a 45 quilômetros de Cascavel, 10% da arrecadação de R$ 900 mil mensais é usado para o pagamento de médicos. O último profissional residente deixou o posto há 14 anos. A cidade tem 5.363 habitantes.
Dois médicos concursados atuam nas unidades de saúde do município, mas a prefeitura mantém contrato com uma clínica de Cascavel, que fornece profissionais para o hospital local. Lindoeste participou da primeira chamada do programa Mais Médicos, sem sucesso. O prefeito Silvio Santana (PMN) pretende se reinscrever no programa.
O ginecologista Celso Cardoso mora em Cascavel, mas duas vezes por semana atende em Lindoeste. Ele vê dificuldades em morar num pequeno município. “Se o sujeito for o único médico da cidade, vai ter de trabalhar 24 horas por dia, 30 dias por mês.”
Também no Oeste, Pato Bragado, com 4.823 habitantes, foi a cidade paranaense com poucos moradores a atrair um profissional do Mais Médicos. Mas não houve tempo para comemorações. “O candidato pensava que ficávamos perto de Londrina. Quando soube da distância de 400 quilômetros, desistiu”, conta a secretária de Saúde, Marciane Specht.
Há seis anos, Pato Bragado chegou a fazer um concurso para contratar um profissional por R$ 6 mil mensais. Ninguém se inscreveu. O único profissional fixo que fazia atendimento na cidade, pelo SUS, abriu um consultório particular. Os outros médicos da prefeitura recebem R$ 20 mil mensais.
(André Gonçalves, com informações de Luiz Carlos da Cruz, de Cascavel)


quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Supermercado causa revolta após instalar manequim negro com pés acorrentados

publicado: gazeta do povo
Comunidade negra se sentiu ofendida e considerou de extremo mau gosto a imagem de uma criança negra sendo utilizada para "decorar" a área destinada a produtos de panificação do supermercado


Uma estátua de um manequim negro com os pés acorrentados, instalada na unidade do supermercado Pão de Açúcar, no bairro da Vila Romana, em São Paulo, está causando revolta nas redes sociais desde o dia 19 de agosto.

A comunidade negra se sentiu ofendida e considerou de extremo mau gosto a imagem de uma criança negra sendo utilizada para "decorar" a área destinada a produtos de panificação do supermercado. Após a foto ser postada no perfil Mundo Negro, uma enxurrada de comentários indignados se espalhou pelo Facebook. Entre as razões apra a revolta, a imagem da criança negra carregando um pesado cesto de pães faz apologia ao trabalho infantil, já que o cesto é de proporções incompatíveis à estatura da criança e seria um sacrifício seja pelo tamanho ou pelo peso para ser carregado.

Além disso, revotou a inclusão de grilhões no pé da criança, rementendo à escravidão, além da infeliz escolha, por usar, mais uma vez, uma criança negra nestas condições ser utilizado para "decorar" uma área de grande circulação do supermercado.

Apesar de o perfil da empresa no Facebook já ter se desculpado pela gafe infeliz e informado que o objeto já havia sido retirado da loja, os protestos - e críticas - na rede social continuam.

Nota oficial

A assessoria de imprensa do Pão de Açúcar enviou à Gazeta do Povo a seguinte nota oficial sobre o caso: "O Pão de Açúcar esclarece que a estátua em questão foi adquirida como parte de uma coleção de peças decorativas de loja, sem intenção ou apologia a qualquer tipo de discriminação. A rede agradece os contatos recebidos dos clientes e lamenta o fato ocorrido, uma vez que pauta suas ações na ética, promoção e respeito à diversidade. Assim que tomou ciência do caso, o Pão de Açúcar providenciou a retirada da estátua das lojas e está revendo o processo de seleção de peças decorativas. A rede permanece à disposição de seus clientes pelo telefone 0800-7732-732."

MP aponta intolerância religiosa como motivo para chacina em Londrina

Diego Quirino, acusado de matar a mãe e três vizinhas, que eram praticantes do Candomblé, foi denunciado por quatro homicídios qualificados e uma tentativa de homicídio por motivo torpe

O promotor de Justiça Thadeu De Goes Lima apresentou denúncia, na quarta-feira (21), contra o maquiador Diego Quirino por quatro homicídios qualificados e uma tentativa de homicídio por motivo torpe. O promotor defendeu na denúncia que os assassinatos das três vizinhas praticantes do Candomblé ocorreram por intolerância religiosa. Quirino também foi acusado de matar a própria mãe e de ter tentado tirar a vida da companheira. A denúncia foi encaminhada para 2ª Vara Criminal de Londrina.

Na avaliação de Lima, os assassinatos podem sim ter motivo religioso. “Ele [Diego] vinha demonstrando um comportamento diferente, impelido por fanatismo religioso e intolerância a outras crenças”, destacou o promotor, que antes da decisão participou de reuniões com representantes do movimento negro de Londrina.

O Ministério Público (MP) pediu que exames de sanidade mental sejam feitos em Quirino. “Eu pedi um laudo de sanidade mental para saber se ele conseguia entender o caráter da atitude que tomou.” Segundo o promotor, os testes serão feitos por psicólogos e psiquiatras do Instituto Médico Legal (IML) de Londrina.

O parecer do MP é contrário ao parecer final do inquérito feito pela Polícia Civil de Londrina. O delegado Willian Douglas Soares, responsável pelas investigações, já havia descartado qualquer motivação religiosa na chacina, já que o suspeito matou a própria mãe e também tentou assassinar a companheira. “Respeito a opinião do promotor. Meu parecer não é vinculativo ao parecer do Ministério Público. Sei que houve uma reunião com o movimento negro que foi até a promotoria e apresentou alguns dados. Como não sei o que foi apresentado, é difícil falar do que eu desconheço”, explicou.

Souza argumentou que, mesmo com a denúncia do MP, ainda descarta que as mortes tenham ocorrido por motivação religiosa. “Ele não teria matado a mãe, tentado esfaquear a companheira e ainda tentado pular na casa de outra vizinha antes de ir para a casa onde houve as mortes. Sem contar quedurante a tarde ele tentou atacar o amigo com uma faca já num primeiro surto”, frisou.

Reunião

Integrantes do grupo ‘Por amor a Yá Mukumby’ se reuniram com o promotor Thadeu De Goes Lima na última semana. Eles afirmam que parentes e amigos que estavam com a vítima poucas horas antes do crime não foram ouvidos pela polícia.

José Mendes, que participa do grupo, afirmou que o promotor recebeu os integrantes. “Nós chegamos a procurar o delegado que investigou o caso, mas ele já tinha encerrado o inquérito. Então procuramos a promotoria e o Thadeu ouviu 6 pessoas”, explicou.

O grupo defendeu que a ação de Quirino teria sido motivada pela religião de Yá Mukumby. “Os santos quebrados não estavam no mesmo cômodo que os corpos. Sem contar que ele ficava observando a casa delas por muito tempo. Desde a mudança dele, a rotina delas mudou, tanto que havia cadeado no portão, coisa que antes dele morar ali do lado isso nunca tinha acontecido”, ressaltou.

fonte:gazeta do povo

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Texto da UNEGRO para III Conferência de Igualdade Racial

Unegro (União de Negros pela Igualdade)


Texto preparatório para a III CONAPIR

A UNEGRO foi criada em 1988, na esteira de um intenso processo de luta por uma Constituição mais democrática e capaz de assegurar os direitos de todo o povo. A Carta Constitucional, que resultou de um amplo processo de mobilização dos movimentos sociais, proclamou a igualdade formal de direitos e, finalmente, tirou o racismo da condição de contravenção penal e o qualificou de crime inafiançável e imprescritível. Também 1988 foi o ano do centenário da abolição da escravatura e o exercício da crítica foi a marca da militância fundadora da entidade, que, junto às demais entidades negras de todo o país, punha abaixo a falsa ideia de democracia racial brasileira, além de denunciar o abismo que separava, e ainda persiste, negros e brancos na estrutura econômica e social. A trajetória da UNEGRO, portanto, tem raízes em um profundo desejo de justiça social que nos levou às ruas construindo e participando das grandes manifestações convocadas por todo o movimento negro e pelos diferentes movimentos sociais, no âmbito local e nacional, sempre empunhando a bandeira da igualdade e da superação do racismo.

Estão ocorrendo movimentações de organismos governamentais de igualdade racial e do movimento negro em todos estados do país, com vista à organização da III Conferência Nacional de Políticas de Igualdade Racial – III CONAPIR. Devido à ausência de um documento que oriente a discussão, percebemos certa dificuldade da militância para abordar o tema por dois motivos essenciais: 1) democracia e desenvolvimento são temas novos para o movimento negro, a tradição é discutir o significado do racismo, seus agravos e formas de superação. Poder e economia são questões intrinsecamente relacionadas com o temário, no entanto, esses assuntos são pouco visitados; 2) não está superada a pauta política da luta antirracismo em curso, ou seja, a população negra brasileira ainda tem problemas com a questão quilombola, com a implantação da Lei 10.639/03, tem salários mais baixos em funções semelhantes, não conseguiu políticas de proteção para as comunidades tradicionais de terreiros, a juventude continua vitimada pela violência, o Estatuto da Igualdade Racial ainda não saiu do papel, e daí por diante, de modo que a III CONAPIR coloca Estado e sociedade civil diante de um inusitado paradoxo: mudar uma pauta de reivindicação política antes de superá-la.
A UNEGRO compreende que o alto brado das ruas continua sendo o mais eficaz instrumento que o movimento social pode lançar mãos para transformar sua realidade. As recentes manifestações sociais iniciadas em junho de 2013, protagonizadas pela juventude e setores médios da sociedade, pautaram a nação exigindo mais e melhores serviços públicos,novos padrões éticos políticos, questionaram os partidos e as instituições, no fundo exigiam mais seriedade e respeito dos políticos e uma vida melhor para o povo. Esse inesperado fenômeno embaralhou o cenário político nacional, preocupou governantes, partidos, movimentos sociais organizados e demonstrou a força do povo nas ruas. Assim tem sido desde a Revolução Francesa, quando a massa de camponeses e pequenos burgueses derrubou o antigo regime. É infalível: democracia se garante nas ruas, lutando. Quando não há povo pressionando as oligarquias e os governantes, as mudanças, quando ocorrem, são lentas e quase sempre em conformidade com a classe dominante.
Devemos medir nossas expectativas sobre as conferências. Elas têm claros limites políticos e institucionais, por ser um espaço formal de diálogo entre Estado e sociedade civil, ter caráter consultivo, temas para discussão, números de participantes e regras definidas a partir dos interesses e chamado do poder público. No entanto, não devemos desconsiderar sua importância tática aos movimentos sociais. Pois, além de ajudar direta e indiretamente com a auto-organização da sociedade civil, as conferências contribuem com o aperfeiçoamento da participação popular e, com a democracia, elimina o descompasso entre a formulação e oferecimento das políticas públicas e as demandas dos públicos beneficiários - algo comum na época em que os burocratas nas confortáveis cadeiras do planalto estabeleciam unilateralmente a política, inspirados por inúmeras ideias brilhantes, sem lastro, sem eficácia e sem foco.


Nos últimos 10 anos, intensificaram-se as conferências no Brasil. Segundo a Secretaria Geral da Presidência da República, entre 2003 e 2012 ocorreram 86 conferências nacionais das 129 realizadas nos últimos 500 anos. Essas mobilizaram sete milhões de pessoas para debater políticas públicas sobre 40 áreas temáticas. Com isso, as conferências se consolidam como principal espaço de articulação e debate de políticas públicas que envolvem alguns movimentos sociais, de modo que o movimento negro está desafiado a – sem abandonar as ruas, palco prioritário dos movimentos sociais e sem criar expectativas que ultrapassa a capacidade política e institucional da conferência – estabelecer táticas que impulsionem a pauta. Nesse caso, as conferências, especialmente a CONAPIR, não podem ser ignoradas na construção desse caminho.

Terreno infértil para a semente da igualdade racial

O Estado brasileiro e as oligarquias que governaram o país desde a desinstitucionalização da escravidão têm histórico de subtração e negação dos direitos políticos e sociais da população negra e pobre. A abismal desigualdade socioeconômica que caracteriza a sociedade brasileira é resultado de uma perversa engenharia política destinada a

concentrar poder e riqueza nas mãos de uma minoria que sempre se locupletou do trabalho escravo e, posteriormente, dos trabalhadores livres nacionais e recém-imigrados.

O Estado foi mantenedor permanente da arquitetura da exclusão, aderindo às ideologias dominantes do racismo científico e do mito da democracia racial, dando legitimidade ao aprovar leis como a que impedia a imigração de africanos ao Brasil e a Lei da Vadiagem, aprovada no início da República, usando a truculência e a força da polícia para controlar as iniciativas políticas populares, proibindo manifestações pacíficas e criminalizando os movimentos sociais, financiando as políticas e avalizando os projetos da classe dominante. Até 1930, a política externa brasileira em matéria comercial tinha como objetivo prioritário melhorar as relações com países importadores com vista à venda do café nacional nos mercados internacionais. Essa era uma forma indireta de indenizar os grandes cafeicultores que perderam seus escravos com a Lei Áurea.

Mulheres e homens negros, índios, trabalhadores e pobres sempre foram desamparados, tratados como problema e caso de polícia. Passamos a conhecer políticas e legislações sociais a partir dos anos 40 do século passado, ainda assim, com caráter populista, paternalista e com um universalismo hipócrita, ou seja, que atende poucos e mantém negros e pobres analfabetos nas favelas, em filas de hospitais ou morrendo vitimados por doenças evitáveis.

Apesar de algumas iniciativas e ação governamental em matéria de reconhecimento sobre a incidência do racismo, como a instituição da Fundação Cultural Palmares no governo Sarney, em 1988, por ocasião do Centenário da Abolição, e a instituição no governo FHC do GTI – Grupo de Trabalho Interministerial para o Desenvolvimento da População Negra, após pressão do movimento negro na realização da Marcha Zumbi dos Palmares Pela Cidadania e a Vida, realizada em 1995, ano do tricentenário da imortalidade de Zumbi, o que prevaleceu foram às heranças nefastas e um Estado estruturalmente excludente, violador de direito e liberal, terreno em que as sementes das políticas de igualdade racial foram lançadas.

CONAPIR anteriores:

A I CONAPIR ocorreu em 2005, o tema foi “Estado e sociedade promovendo a igualdade racial” e o objetivo era elaborar o Plano Nacional de Igualdade Racial - PLANAPIR. Na ocasião, a produção governamental sobre igualdade racial era incipiente, o Estado não tinha diagnóstico confiável sobre a situação da população negra brasileira em vários campos, a Secretaria Nacional de Igualdade Racial - SEPPIR era um órgão em constituição, os parâmetros para constituição do PLANAPIR eram escassos, a principal referência era a Declaração e o Plano de Ação de Durban, aprovados na III Conferência Mundial Contra o Racismo,

Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, organizada pela Organização das Nações Unidas – ONU, em 2001, além do acúmulo do movimento negro. Para salvaguardar o respeito do governo ao processo democrático, foi necessário chamar a sociedade civil para opinar na elaboração do Plano.


O resultado da I CONAPIR foi a aprovação de insumos que organizaram o PLANAPIR com objetivos em 12 eixos temáticos: Trabalho e Desenvolvimento Econômico, Educação, Saúde, Diversidade Cultural, Direitos Humanos e Segurança Pública, Comunidades Remanescentes de Quilombos, Povos Indígenas, Comunidades Tradicionais de Terreiro, Política Internacional, Desenvolvimento Social e Segurança Alimentar, Infraestrutura e Juventude. O PLANAPIR foi avaliado e repactuado na II CONAPIR, realizada em 2009, e hoje tem condições de nuclear as políticas de igualdade racial no governo federal, embora a participação do movimento negro em outras conferências temáticas tenha contribuído para aprofundar objetivos e ajustar políticas para além do PLANAPIR.

III CONAPIR

O tema da III CONAPIR é “Democracia e Desenvolvimento sem Racismo: Por um Brasil Afirmativo”. A conferência será realizada em Brasília, entre os dias 5 e 7 de novembro deste ano. Devido à magnitude do assunto que será abordado para organização da sociedade brasileira, será uma conferência diferente, pois exigirá que o movimento negro se posicione diante de temas que tradicionalmente tem discutido muito pouco. Os (as) conferencistas e as organizações do movimento negro estão desafiadas a propor medidas que incidam positivamente sobre a democracia e desenvolvimento nacional com vista à promoção social da população negra. O temário vai ser abordado a partir de quatro subtemas:

a) Estratégias para o desenvolvimento e o enfrentamento ao racismo:

“A gente não quer Só dinheiro A gente quer dinheiro E felicidade A gente não quer Só dinheiro A gente quer inteiro E não pela metade...”

Titãs

Para UNEGRO, a definição do que significa desenvolvimento não é isento de ideologia. Por isso, nem sempre falamos a mesma coisa quando usamos o mesmo vocábulo. Consideramos desenvolvimento o progresso das forças produtivas com vista à satisfação das necessidades humanas e elevação da qualidade de vida, assegurando o bem comum e a segurança das gerações futuras. Diferentemente de crescimento econômico que não tem o elemento humano no centro.

Trabalhamos com o conceito “desenvolvimento sustentável soberano”, considerando a necessidade de progredir, preservando os recursos naturais e o meio ambiente, sem ingerência externa e tendo o povo a razão do progresso. Nesse subtema, sem prejuízo das propostas no campo econômico real que serão apresentadas, a UNEGRO priorizará a luta no campo das ideias com o Estado e a sociedade sobre o modelo de desenvolvimento mais adequado ao combate ao racismo e a justiça social no país, assim daremos nossa contribuição sobre que Brasil o movimento negro e antirracismo desejam construir.

Os impulsos nacional-desenvolvimentistas protagonizados pelo Estado na Era Vargas, Planos de Metas de Juscelino Kubistchek e na fase do Milagre Econômico durante o governo militar aceleraram o crescimento das forças produtivas; estruturaram infraestruturas viárias, aeroportuárias e portuárias que permitiram maior escoamento de mercadorias; construíram grandes usinas hidrelétricas e nucleares, poderosas estatais nas áreas petrolíferas, mineradora, telefônica, elétrica, financeira; atraíram investimentos estrangeiros, indústrias modernas em vários setores, como automobilístico, químico, farmacêutico, tecnologia de ponta, dentre outros.

Todo esse crescimento econômico, média de 10% ao ano, transformou o Brasil na quinta maior potência econômica e industrial do planeta. No entanto, aprofundaram a clivagem socioeconômica entre o norte e o sul, ricos e pobres, mulheres e homens, negros e brancos. O Brasil cresceu economicamente, mas não se desenvolveu, pois não foi capaz de incorporar a dimensão humana, não se pode falar em desenvolvimento sem gente. Há mais problemas nesse dito modelo de desenvolvimento: grande dependência econômica e tecnológica dos países ricos e desenvolvidos e relação insustentável com a natureza.

Nas décadas de 80, conhecida como década perdida, e 90, os ideários neoliberais hegemonizam os planos de desenvolvimento, estabelecem o caos na economia nacional e nos direitos do povo. Subordinam a economia nacional ao imperialismo, obedecem ao FMI com fidelidade canina, entregam a pátria aos capitais estrangeiros. Se anteriormente, com a doutrina nacional-desenvolvimentista o país enriquecia e não incorporava a população negra e pobre, durante o neoliberalismo o rentismo lucra, o Brasil empobrece e aprofunda as desigualdades sociais e econômicas, os pobres atacados pela subtração de direitos, arrocho

salarial e desemprego ficam mais pobres e os ricos mais ricos. A tese do estado mínimo, da autorregulação do mercado, da riqueza pessoal como fruto da competência, mérito e sucesso do indivíduo são falácias neoliberais que o movimento negro deve denunciar e combater, pois qualquer proposta de desenvolvimento com essas premissas resultam em fome, recrudescimento do racismo e violência.

Para UNEGRO, apesar das diferenças explicitadas, as experiências de implantação das duas doutrinas no desenvolvimento nacional falharam em matéria de justiça social, por considerarem negros, pobres e comunidades tradicionais obstáculos para o desenvolvimento. Concebemos que o desenvolvimento tem que incorporar a dimensão humana em sua complexidade e diversidade, não pode ser confundido exclusivamente com acesso ao consumo, às tecnologias e ao conforto. Qualquer proposta economicista e produtivista não se sustenta. Devemos diferenciar crescimento econômico de desenvolvimento, pois acreditamos que a questão social deve ser considera.

Interessa ao movimento negro e à luta contra o racismo no Brasil que essa conferência, para além das propostas pontuais no campo do trabalho, renda e empreendedorismo, firme posição em defesa de um modelo de desenvolvimento sem racismo, com sustentabilidade e soberania nacional, distribuição de renda e igualdade de oportunidade, valorização do trabalho, forte presença do Estado na regulação e fomento à economia, que combata as desigualdades regionais, de classe, gênero e raça, que compreenda o ser humano como a razão para desenvolver-se, e não o mercado. Não podemos subestimar essa compreensão, pois dela se planeja o investimento e a ação da Nação.

b) Arranjos institucionais para assegurar a sustentabilidade das políticas de igualdade racial

A Declaração da III Conferência Mundial contra o racismo considerou a escravidão e o tráfico de escravos crimes contra a humanidade: “Horríveis tragédias na história da humanidade, não apenas por causa do seu terrível barbarismo, mas também pela sua magnitude, natureza organizada e especialmente sua negação da essência das vítimas”. Durban reconheceu também que: “Os Africanos e Afrodescendentes foram vítimas destes atos e continuam a serem vítimas das suas consequências”.


O Sistema Nacional de Políticas de Igualdade Racial – SINAPIR, previsto no artigo 5º e relativamente desenvolvido no Título III do Estatuto da Igualdade Racial, é uma determinação legal. Portanto, cabe ao poder público instituí-lo. Sua concepção tem base na experiência institucional iniciada com a implantação da SEPPIR, em 2003. O sentido precípuo do SINAPIR é de estabelecer os arranjos institucionais para operacionalizar a política de igualdade racial,

estabelecer uma estrutura coerente capaz de contribuir para que as políticas cheguem aos beneficiários.

Dadas a complexidade de seus objetivos, organização e competência, verificou-se a necessidade de regulamentação, na III CONAPIR a SEPPIR receberá propostas mais elaboradas para regulamentar o SINAPIR, assim como a II CONAPIR buscou e aprovou apoio para aprovação do Estatuto da Igualdade Racial no Congresso Nacional. Consideramos que as conferências também são espaços corretos para buscar legitimidade em temas sensíveis e complexos.

O SINAPIR é algo novo, sem paralelo, embora tenha o Sistema Único de Saúde – SUS, que pode inspirar boas alternativas ao SINAPIR. Consolidar uma proposta que dê forma ao Sistema Nacional de Igualdade Racial exigirá criatividade e criteriosa avaliação das estruturas formais de igualdade racial (órgãos de promoção da igualdade racial, fórum de gestores, conselhos e ouvidorias). Estas serão a base na qual se assentará o SINAPIR. Algumas diretrizes são possíveis adiantar:

1) Defender a criação de fundos municipais, estaduais e nacional de igualdade racial para dar sustentação ao sistema – a PEC 02/2006 do Senador Paulo Paim institui o Fundo Nacional, proposta tramitando no Senado;

2) Defender o não contingenciamento às previsões orçamentárias da política de igualdade racial;

3) Instituir competências comuns, mas diferenciadas aos entes federativos, considerando maior ônus na implantação da política de igualdade racial a seguinte ordem: União, estados e municípios;

4) Defender a instituição de organismo de igualdade racial em todos médios e grandes municípios e em todos estados, com suporte técnico e orçamentário adequado;

5) Transformar as conferências e conselhos de políticas públicas em instâncias deliberativas;

6) Fortalecer o FIPPIR (composto por gestores estaduais e municipais, sob a coordenação da SEPPIR) e os fóruns de gestores como instâncias de pactuação e deliberação de metas comuns, com previsão de sanção ao não cumprimento de metas.

c) Políticas de igualdade racial: avanços e desafios:
Além do grande arsenal institucional implantado (secretarias, coordenadorias e conselhos) e do aperfeiçoamento do ordenamento jurídico para igualdade racial (lei 10.639/03, Estatuto da Igualdade Racial, Lei das Cotas e Decreto 4887/03), os programas sociais de transferência de renda; o direito de aposentadoria aos trabalhadores rurais sem necessidade de comprovar

30 de contribuição à previdência; os mecanismos de acesso as universidades que juntos (PROUNI, FIES e as cotas nas universidades federais públicas) permitiram a inclusão de aproximadamente 1.3 milhões de negros por ano no ensino superior; a política de fortalecimento do salário mínimo; a aprovação dos direitos trabalhistas para as empregadas domésticas, revogando o mais acentuado resquício da casa grande; o programa Brasil Quilombola, Minha Casa Minha Vida, Luz Para Todos, são políticas universais e de ações afirmativas que contribuíram para elevar o padrão de vida da população negra brasileira.

A UNEGRO compreende que os registros positivos de avanços na política de igualdade racial nos últimos anos devem ser reconhecidos. Não podemos trabalhar com a perspectiva de que apenas acumulamos derrotas, que todos os esforços realizados na luta contra o racismo têm sido em vão, que negras e negros não têm capacidade de galgar vitórias e que o povo brasileiro é visceralmente insensível à luta do movimento social negro. Se não formos capazes de registrar as conquistas, não seremos capazes de estabelecer estratégias oportunas para a luta do movimento negro.

No entanto, as graves assimetrias socioeconômicas entre negros e brancos se mantêm. O Brasil continua profundamente desigual, a população negra ainda acumula desvantagens no campo econômico, social, político e cultural. Apesar de registrarmos avanços, há contradições. A SEPPIR continua frágil técnica e institucionalmente; as políticas de igualdade racial têm baixíssima execução e altíssimo contingenciamento; as metas do PLANAPIR não saíram do papel, bem como não há conhecimento de seu conteúdo pela máquina administrativa; as diretrizes e políticas públicas impostas pelo Estatuto da Igualdade Racial precisam de observância pelo poder público; a Lei 10.639/03 não foi incluída no sistema de educacional, ainda está sob dependência da sensibilidade de alguns profissionais; a regularização das terras quilombolas estagnou, o INCRA tem se mostrado incompetente nessa matéria e a AGU não tem apresentado soluções técnicas jurídicas que evitem a enorme judicialização dos direitos quilombolas; mesmo tendo aumentado a escolaridade as mulheres negras continuam na base da pirâmide socioeconômica. Apesar de esse diagnóstico ser antigo, pouco foi feito. O Estado mantém-se insensível e omisso; a juventude sofre um período de recrudescimento da violência, atualizando a denúncia do “Extermínio Programado da População Negra”, levada ao público pela UNEGRO, em 1991 no I Encontro Nacional de Entidades Negras – ENEN.

Compreendemos que as poucas conquistas desses 10 anos já foram assimiladas pela sociedade, tornaram-se direitos. O povo não aceitará retrocesso. Em junho, as grandes mobilizações da massa nas ruas disseram isso: querem mais. Há uma geração que não viveu os impactos do neoliberalismo hegemônico. Os impasses são outros e precisamos avançar. Diante disso, a sociedade civil deverá ser bastante crítica na conferência, denunciar a letargia na implantação das políticas de igualdade racial e exigir gestos concretos do poder público. Não podemos propor e reiterar propostas infinitamente, precisamos obter resultados práticos.

d) Participação política e controle social: igualdade racial nos espaços de decisão

A UNEGRO estabeleceu como objetivo principal de sua atuação na conjuntura atual a luta para a população negra ascender e compartilhar espaços de poder. Consideramos que sem força política real não conseguiremos dar o ritmo adequado à pauta da população negra. O processo político que encerrou com a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial e da Lei de Cota nas universidades públicas federais no Congresso Nacional, explicitou o tamanho da resistência as políticas de igualdade racial no Brasil. Enfrentamos as principais empresas e meios de comunicações (Globo, Estadão, Veja, Folha de São Paulo, etc.) e sua bancada parlamentar; bancada ruralista, composta por aproximadamente 120 parlamentares; bancada evangélica, com 56 parlamentares; o Partido dos Democratas – DEM, PSDB e PPS; setores da intelectualidade, dentre outros. A vitória aponta para força a política da população negra e para a necessidade dessa força ocupar espaços reias de poder.

Esse subtema tem importância estratégica, pois aborda um elemento sensível no processo de marginalização da população negra brasileira: nossa defeituosa democracia. Democracia significa “governo do povo, sistema em que cada cidadão participa do governo”. Desde seu nascedouro, há 2.500 anos, na Grécia Antiga, que o conceito foi cunhado e se mantém intacto. Não existem no tempo ou espaços definições divergentes. Há duas formas de exercer a democracia: participativa e representativa. A III CONAPIR será um momento em que o campo da igualdade racial aprofundará o debate sobre a participação e representação negra e popular no governo, ou seja, no destino dos municípios, dos estados, da nação.

Em matéria de representação popular, precisamos exigir maior valorização dos instrumentos de consulta popular como os plebiscitos e referendos; diminuir as exigências draconianas para projetos de leis de iniciativas populares; exigir consulta à população em matérias polêmicas (como a divisão dos royalties do petróleo, 10% do PIB para educação e código florestal); instituir caráter deliberativo aos conselhos e as conferências, como dito anteriormente.

A participação de negros (as) comprometidos com o povo e com a nação nos espaços de poder é o impasse mais sensível da democracia brasileira e o mais visceral desafio do movimento negro. Uma democracia que não incorpora 50,06% da população é questionável. Não podemos aceitar a profunda sub-representação da população negra no Congresso Nacional, nas Câmaras de Vereadores, Assembleias Legislativas, Prefeituras e Governos estaduais.


Além da contundente denúncia ao racismo que normaliza a desigualdade, devemos defender uma reforma política que corrija essa e outras graves injustiças, a UNEGRO defende uma reforma política (não apenas eleitoral) com as seguintes diretrizes: aumente a participação popular; com financiamento público exclusivo com vista a combater a influência do poder econômico sobre o resultado eleitoral; fortalecimento dos partidos e contra o princípio da soberania individual dos mandatos; lista partidária com paridade de gênero e raça/cor; percentual mínimo de negros e mulheres nas direções partidárias e nos primeiros escalões de governos.

Temos consciência que ainda há muito para avançar. Em decorrência dos agravos do racismo, a população negra acumula desvantagens econômicas, políticas e sociais. Por isso, nosso principal desafio será tirar do papel as conquistas estabelecidas em lei e as pactuadas nos processos de diálogo entre poder público e sociedade civil. Para isso, será necessária uma grande união do movimento negro em torno da luta pela maior presença de negros nos espaços de poder.
Em 14 de julho de 1988, a UNEGRO completou 25 anos ininterruptos de luta política contra o racismo. Temos muito a comemorar, porque somos artífices das vitórias do movimento negro brasileiro e porque obra que não presta tem grande possibilidade de não sobreviver 25 anos, ou seja, a matéria-prima que gerou a UNEGRO é de boa qualidade.
Nossa matéria-prima são compreensões de como se estrutura a dominação: convicção que o racismo é um fenômeno que deve ser superado, pois não beneficia a humanidade, ao contrário, aprisiona, gera conflitos, divide e vitimiza; consciência que a luta de classe e a luta contra a dominação de gênero compõe o triple da luta emancipatória da população negra e do povo brasileiro; determinação em não se adaptar ao racismo, ir à luta para sua superação.
Assim, a UNEGRO tem enfrentado nesse quarto de século as vicissitudes da luta contra o racismo. Apesar de o paradoxo da nossa existência ser a luta para a nossa inexistência, fazemos votos de sucesso e longa vida para a entidade.

Parabéns à UNEGRO!

Parabéns aos unegrinos e unegrinas!

Parabéns ao movimento negro brasileiro!

REBELE-SE CONTRA O RACISMO!

UNIÃO DE NEGROS PELA IGUALDADE (UNEGRO)

Líder de comunidade quilombola é morto em Belém

Luciano Nascimento
Repórter da Agência Brasil

Brasília - O líder quilombola Teodoro Lalor de Lima, conhecido como Senhor Lalor, foi morto hoje (19) em Belém, capital paraense. Ele foi esfaqueado no peito por um homem que invadiu a casa de um parente onde Lalor estava hospedado, fugindo em seguida.

Senhor Lalor era presidente da Associação dos Remanescentes de Quilombo de Gurupá, no município de Cachoeira do Arari, na Ilha de Marajó. Ele tinha ido a Belém participar do Encontro Estadual de Quilombolas do Pará, que vai até a próxima quinta-feira (22). Na última terça-feira (13), durante audiência pública promovida pelo Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público do Estado, o líder denunciou a perseguição de fazendeiros da região à comunidade quilombola.

Na mesma a audiência, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) entregou à Comunidade de Gurupá o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), que reconhece as terras onde fica a comunidade como de ocupação tradicional de descendentes de escravos levados à região para trabalhar em fazendas.

Organizações que defendem o meio ambiente e os direitos das populações tradicionais divulgaram uma carta na qual relatam que, em visita à comunidade onde vivem os mais de 700 moradores, no último dia 14, os moradores se mostraram preocupados com a situação e pediram a "ajuda do Ministério Público para que os direitos da população não sejam cerceados e que haja proteção das pessoas que fazem denúncias de discriminação e opressão".

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Brasileira ganha o título de Miss Universo Mirim 2013

É de uma carioca de oito anos o título de Miss Universo Mirim 2013, concurso que aconteceu no dia 27 de julho, no México. Maria Victórya Manzi de Sant' Anna foi eleita a menina mais bela das Américas no evento Mini Miss América Internacional. 
“Não temos como descrever o sentimento ao lerem o nome da minha filha como a ganhadora do concurso. Fizemos camisas personalizadas, levamos bandeiras do Brasil, foi uma verdadeira festa”, disse a mãe da pequena, Ana Carolina Manzi Sant’Anna.


Conquistar o título de Mini Miss Universo 2013 não foi um trabalho fácil para Maria Victórya, que conseguiu ajuda da ONG Niterói+Humana para arrecadar dinheiro para sua ida ao México. 
No concurso, a menina ganhou destaque com seu vestido de gala, uma homenagem a Carmem Miranda. O criador da fantasia foi ninguém menos que João Calheiros, profissional da escola de samba Beija-Flor de Nilópolis. 
Entre as atividades da Miss estão as aulas de dança e os trabalhos como modelo. O que ela deseja para o futuro? Mais aplausos, claro.

fonte:yahoo!Brasil

Entre o indizível e o narrável: Palavras possíveis para Yá Mukumbi, farol para as culturas negras


publicado: www.palmares.gov.br

“É surpreendente que se tenha tão pouco a dizer justamente a respeito de acontecimentos tão extremos. A linguagem humana foi inventada para outros fins.” – Ruth Klüger

Se não há lugar no simbólico, não vai existir narrativa capaz de recobrir os acontecimentos humanos, restando apenas as marcas indeléveis da experiência traumática. Os assassinatos de dona Vilma Santos de Oliveira,66, a sempre querida Yá Mukumbi, de sua mãe, Alial de Oliveira dos Santos, 86, e neta, Olívia Santos de Oliveira,10, em uma investida psicótica de um vizinho no último sábado, 3, em Londrina, é um desses terríveis episódios traumáticos que alojam-se além da capacidade de qualquer nomeação, das possibilidades de representação. As palavras resistem às tentativas de conferirmos sentido ao ocorrido e como toda experiência traumática, a perda brutal de Yá Mukumbi e parte de sua família deixam feridas abertas na memória coletiva e abrem um flanco para questionamentos irrespondíveis: Por que aconteceu? Por que elas? Como uma mulher da estatura de dona Vilma tem sua vida interrompida por um homem inteiramente tomado de surto psicótico, conforme atestou laudo médico? De onde vem desmedida loucura? Houve fundamento religioso no bárbaro ataque? Acrescente-se à tragédia na casa de mãe Vilma, o fato de que minutos antes, o assassino cometera uma outra, matando a própria mãe, num forte prenúncio de que quando se mata a própria mãe tudo o mais é possível. Um crime só contra mulheres, velhas e nova, de quatro gerações, perpetrado por um homem em trajes menores de posse de uma faca.
Embora sucedam-se casos semelhantes ao ocorrido na Rua Olavo Bilac, no fatídico dia 3, o horror que cada história singular evoca é sempre sem par. Não existem parâmetros nem reincidências com os quais podemos nos apaziguar em termos narrativos. Comoção, perplexidade, dor, vazio, revolta, nos assaltam sem podermos sequer acomodar o luto, que parece se arrastar indefinidamente. O que nos resta, então, num “cenário de terra arrasada”?
Os estudos psicanalíticos nos ensinam que embora o trauma habite o campo do indizível, impõe-se a necessidade dese tecer uma narrativa do depois, um discurso que rearranje o que ficou fora de lugar, de se produzir um efeito de tempo, uma (res)significação do choque, a deflagração incontornável de um processo de reconstrução. Qual seria, então, a narrativa possível? Quais as possibilidades de representação do inominável?
A vida plena, a vida digna, a vida austera sem ser pesada, a vida terna, a vida leve, a vida lúdica, a vida comprometida, a vida engajada, a vida vivida de Yá Mukumbi – uma vida desproporcional ao seu desfecho – nos restitui a possibilidade de contar uma história e construir memória sobre ela, sua mãe e neta.
Mãe Vilma ou Yá Mukumby Alagangue, nome de origem quimbundo, movimentava-se sobre um largo espectro: zeladora do terreiro do Ylê Axé Ogum Mege, militante histórica do movimento negro de Londrina, mulher altiva, integrante de fóruns e associações locais e nacionais, coordenadora do Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial, cantora de estirpe, dona de uma voz altissonante, mãe de seis filhos, cozinheira de mão cheia, gestora cultural e política dos expedientes da população negra, convicta defensora das cotas raciais para jovens negros nas universidades públicas (protagonizou a implantação das cotas na Universidade Estadual de Londrina, em 2005, e manteve-se fiel a luta ao engrossar as fileiras pela manutenção desta política, em 2011), generoso ser humano, diuturnamente atenta àqueles que vivem nas franjas da sociedade,construiu um biografia sólida, sagrou-se pessoa extraordinária, sempre pôs-se acima do banal. A densidade e força que lhe eram peculiar renderam-lhe um livro “Yá Mukumbi: a vida de Vilma Santos de Oliveira”, escrita por professores e estudantes da Universidade Estadual de Londrina (UEL), em 2010.
Do lugar em que via o mundo, a partir de múltiplos prismas, não abriu mão de princípios éticos e de justiça para combater o racismo, o sexismo e a intolerância religiosa. Do alto de sua sabedoria, sabia “converter” jovens para o combate contra a discriminação racial ofertando a eles possibilidades de tecerem um trajetória vinculada à ética, ao bem fazer e ao bem viver. Sempre pronta para as lides dos movimentos negros, deixava um lastro de esperança para aqueles que supunham estar tudo ou quase tudo perdido. Nunca se omitia frente às injustiças e problemas sociais e, habitualmente, se lançava de maneira proativa para equacionar os dramas de quem dela se aproximava. Crianças, para ela, era patrimônio de primeira linha; delas, costumava dizer, tínhamos o compromisso de cuidar. O abate de sua neta de dez anos confere à tragédia, por esses e outros motivos, uma carga ainda mais brutal.
Consagrada figura pública, Yá Mukumbi prestou serviço para o Estado brasileiro, fez sua voz ecoar no ambiente acadêmico, desarmou teorias caducas para pensar a sociedade, atraiu a atenção de figuras públicas, como Gilberto Gil, que pediu-lhe artigo para uma publicação; mantinha vínculos afetivos com tantas outras, a exemplo de Dona Zica. Inegavelmente, esta mestra fincou raízes para substantivas mudanças sociorraciais, ampliou o escopo das culturas negras, protegeu e salvaguardou o patrimônio africano no Paraná, construiu fronteiras para a manutenção das manifestações artísticas orientadas pelo protagonismo do negro, sem, contudo, erguer delimitações, tampouco promover distinções e exclusões. Direta e indiretamente, reorientou as políticas públicas no campo da cultura e da religião…
A Fundação Cultural Palmares (FCP) prestou-lhe singela homenagem em 2008. Na época, como agora, sabia do alcance das práticas de Yá Mukumbi. Sente-se, como todos, imersa em uma experiência por ora dolorosa, em que o poder público se apequena com a perda de uma gestora cultural imprescindível. Mas, acredita-se: no horizonte do possível, torna-se compromisso inadiável da FCP e outras instituições pinçar, do oceano de iniciativas de Yá Mukumbi, referências e práticas para a emancipação da sociedade, livre de racismos, sexismos, intolerância religiosa.Entre o irrepresentável da tragédia e o narrável da esperança, fiquemos com esta última possibilidade, virtude que mãe Vilma sempre nos legou e continuará assim fazendo.

Rosane da Silva Borges
Coordenadora geral do CNIRC (Centro Nacional de Informação e Referência da Cultura Negra)/ Fundação Cultural Palmares/MinC
Professora da Universidade Estadual de Londrina (UEL)

domingo, 4 de agosto de 2013

Tragédia:Liderança de Londrina, Yá Mukumby, é assassinada


Vilma Santos de Oliveira, 63 anos, mais conhecida como Yá Mukumby, foi esfaqueada no quintal da própria casa e morreu na noite deste sábado em Londrina. Ela morava na rua Olavo Bilac, nas proximidades do Jardim Bancários, zona oeste da cidade. Sem saber, Vilma foi envolvida em uma tragédia que também culminou na morte de outras três pessoas, duas delas parentes de Vilma.
O comandante da Polícia Militar em Londrina, coronel Samir Elias Geha, contou que o autor dos quatro homicídios estava na casa de amigos em Cambé quando teria se envolvido em uma confusão. A namorada e a mãe dele o levaram para um hospital de Cambé. Os três retornaram à Londrina na noite deste sábado e seguiram para a residência na rua Olavo Bilac, onde o casal morava. Minutos depois, o rapaz saiu do banho transtornado. A namorada relatou à polícia que ele dizia estar "com o diabo no corpo" e que precisava eliminá-lo. Os dois discutiram e ele a agrediu. A mãe do rapaz pediu para que a moça fugisse do local e buscasse ajuda e o rapaz acabou esfaqueando a própria mãe. Ariadne Benck dos Anjos, de 48 anos, não resistiu aos ferimentos. O autor do crime estava nu e correu em direção à rua com uma faca nas mãos. Ele estava a procura da namorada, mas encontrou uma senhora que estava na calçada da casa vizinha. Allial de Oliveira dos Santos, de 86 anos, também foi esfaqueada e morreu no local. No quintal da residência estavam Vilma Santos de Oliveira, mais conhecida como Yá Mukumby, e Olívia Santos de Oliveira, de 10 anos, que foram mortas em seguida.
Conforme testemunhas, o homem ameaçou outros vizinhos e a jovem entrou em um salão de festas próximo ao local. Ela conseguiu o apoio de outras pessoas e, quando o rapaz a encontrou, os participantes da festa conseguiram conter o autor dos crimes.O homem de 30 anos foi preso em flagrante pela Polícia Militar. Socorristas do Siate tentaram atender às vítimas, mas elas não resistiram aos ferimentos. O corpo de Ariadne Benck dos Anjos, 48 anos, será velado na Igreja Batista do Jardim Bandeirantes. O sepultamento está marcado para às 16h no Cemitério Jardim da Saudade. As outras três vítimas da mesma família serão veladas na rua Elis Regina, 23, em Cambé. O sepultamento será nesta segunda-feira, às 9h, no Cemitério Jardim da Saudade.
"É lamentável. Esse rapaz estava completamente transtornado para causar essa tragédia toda", resumiu o coronel Geha que esteve no local do crime. A suspeita é de que o autor dos homicídios é usário de droga.