terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Só crianças brancas, por favor!

DADOS DO CNJ -Gazeta do Povo
Quase metade dos candidatos à adoção quer escolher a cor da criança
Metade dos pretendentes à adoção da Região Sul quer criança branca. Ao todo no Brasil, 37,25% querem receber em seus lares crianças brancas

O cadastro de adoções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revela uma realidade cruel: 37,25% dos candidatos a pais - 11.316 do total de 30.378 - só aceitam receber em seus lares crianças brancas. Ou seja, se houver uma criança disponível, mas com outra cor de pele, a adoção não será considerada por esses adultos. De acordo com os números do cadastro, a raça ainda é um fator essencial na hora de uma família escolher uma criança. Dos adultos inscritos, 14.259, ou 46,94%, fazem questão de escolher a cor da pele do futuro filho.
Além das exigências caucasianas, 5,81% (1.764) só aceitam uma criança de pele parda; 1,91% (579) só aceita uma criança negra; 1% (304) só aceita uma criança amarela; e 0,97% (296), uma criança indígena.
O perfil de quem aguarda um lar não é condizente com as exigências. No cadastro, a maioria das crianças e adolescentes é parda - 50,57%, ou 4.020 de um total de 7.949. Estão disponíveis 2.411 crianças brancas, ou 30,33% do total. Também aguardam uma família 1.441 (18,13%) crianças negras, 41 (0,52%) amarelas e 36 (0,45%) indígenas.
A juíza Andréa Pachá, titular da 1ª Vara de Família de Petrópolis (RJ), alerta para o perigo de se ver a adoção como um processo biológico, e não de acolhimento. "É um dado estarrecedor. Ainda é forte a fantasia de que a adoção deve obedecer aos critérios da família biológica. Família é muito mais um núcleo de afeto do que herança biológica. Criança é criança, não tem cor. O discurso que se tem é o de que a criança não pode se sentir diferente. Mas isso é uma forma de racismo", analisa.
A tese faz sentido. No cadastro, metade dos pretendentes à adoção da Região Sul só querem uma criança se ela for branca. Para a magistrada, que lida com esse tipo de situação diariamente, o cenário melhorou nos últimos anos.

"Isso era pior antes. Hoje é mais fácil por uma criança de outra raça em uma família substituta. Temos encontrados casais que queriam uma menina loira de olhos azuis e, depois de visitar um abrigo, mudam de ideia. Esse perfil de menina loira de olhos azuis não é o que temos nos abrigos", diz.
Há ainda outras dissonâncias entre o perfil desejado pelos pais e as crianças disponíveis para a adoção, como a idade, os eventuais problemas de saúde e o fato de haver irmãos (nesses casos, não é recomendada a separação deles). Essas exigências têm impedido milhares de adoções no país. São 30.378 adultos cadastrados e 7.949 crianças aguardando a adoção. Ou seja: há 3,8 candidatos a pais por menor abandonado. Ainda assim, desde a criação do cadastro, em abril de 2008, o mecanismo proporcionou apenas 267 adoções.
A idade também é determinante na hora de escolher um filho. Os candidatos à adoção preferem crianças mais novas. Apenas 6,78%, ou 2.058, aceitam crianças com idade entre 6 e 10 anos. Outros 228 (0,76%) aceitam adotar um menor de 11 a 17 anos. No cadastro, há 2.006 crianças, ou 25,2% do total, com idade de 6 a 10 anos. Há também outras 3.855 crianças e adolescentes, ou 48,5%, com idade entre 11 e 17 anos.
Entre os pretendentes a pais, 5.342, ou 17,59%, aceitam adotar irmãos. Existem no cadastro 1.531, ou 19,26%, crianças com irmãos. Boa parte das crianças disponíveis - 1.411, ou 17,75% - têm problemas de saúde. O cadastro não tem informação de quantos adultos aceitam adotar uma criança doente.



segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Desembargadora Luislinda Valois, 1ª juíza negra brasileira

Neta de avô escravo, filha de Santo, e primeira mulher negra a entrar para a magistratura no Brasil, Luislinda Valois, 68, quer ver mais “pretos, pobres e periféricos” governando o país. A magistrada baiana, que se formou em Direito aos 39 anos, com crédito educativo, fala ao Boletim Gênero, Raça e Etnia sobre racismo, superação, cotas, Justiça e o papel de organizações internacionais, como a ONU, na promoção da equidade.
Nomeada desembargadora substituta do Tribunal Superior de Justiça da Bahia (TJ/BA) em agosto, Luislinda recebeu o Prêmio Cláudia no mês passado, por sua luta e conquistas no combate à discriminação racial. É autora de “O Negro no Século XX” e tem dois outros livros a caminho.
Racismo na Escola – “Não é fácil ser negra e pobre nessa terra”, diz Luislinda, filha de Iansã, orixá guerreira. “Quando nasci, morávamos em um casebre de palha. Só com muita luta meus pais conseguiram construir uma casa de taipa. Para estudar, eu catei marisco, tomei conta de criança, lavei muita roupa.”
Aos nove anos, o professor de Luislinda mandou os alunos levarem réguas e compassos de plástico para a aula, no Colégio Duque de Caxias, na Liberdade, bairro negro de Salvador. O pai, motorneiro de bonde, só conseguiu comprar material de madeira. O professor disparou, na frente de toda a turma: “Menina, se seus pais não podem comprar material para você estudar, saia daqui. Vá aprender a fazer feijoada na casa de uma branca que você vai ser mais feliz”.

“Eu saí da sala correndo, chorei, chorei”, conta a magistrada, voz embargada ao lembrar humilhação, há quase 60 anos. Depois se recompôs e voltou para a aula, com a resposta na ponta da língua: “Professor, eu não vou aprender a fazer feijoada não. Vou estudar para ser juíza e, quando crescer, vou te prender”.
Luislinda formou-se em Direito aos 39 anos e, em 1984, cumpriu a promessa de se tornar juíza. Voltou ao colégio Duque de Caxias, mas não para prender o professor racista. Entre 2002 e 2003, a magistrada freqüentou colégios da capital baiana com o “Projeto Inclua no Trabalho e na Educação e Exclua da Prisão”.

“Dizem que sou a primeira juíza negra do Brasil. Não sei bem se isso é verdade, o importante não é ser a primeira ou a décima. O importante é a bandeira que eu carrego”, diz Luislinda, quem em agosto foi nomeada desembargadora substituta do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA).

Justiça para tod@s – Luislinda Valois se tornou conhecida no meio jurídico brasileiro em 1993, por sua sentença condenatória a rede de supermercados, pelo crime de racismo. Os seguranças haviam acusado injustamente de furto uma cliente negra.

“Pode publicar o nome dela, é uma mulher honesta, de uma coragem impressionante, e gosta que saibam o que aconteceu”, diz Luislinda. Aila Maria de Jesus, franzina, negra, trabalhadora doméstica, foi acusada de furtar um frango e um sabonete. Cercada pelos seguranças do supermercado, ela se recusou a abrir a bolsa sem a presença da polícia. Revelada a injustiça, Aila recorreu aos tribunais.

“O acesso à Justiça é um direito fundamental”, afirma Luislinda, destacando o papel de organismos internacionais, e principalmente da ONU, “que foi e ainda é fundamental para promover os Direitos Humanos no Brasil”.

A desembargadora vê avanços no respeito à cultura e religiões afro-brasileiras. “Tenho uma boa relação de trabalho com a Igreja Católica, Igrejas Evangélicas, inclusive com pessoas da Igreja Universal [que já teve líderes acusados de intolerância religiosa]. Agora mesmo fui convidada para ser paraninfa da turma de Direito da Faculdade Batista Brasileira e aceitei, com muito orgulho. O Brasil é uma país laico, e respeito é fundamental”, diz a magistrada.

Nem sempre foi assim. O candomblé era perseguido até o início do século XX, e Luislinda ainda se lembra quando, menina, acompanhava as idas e vindas da tia para conseguir autorização para o funcionamento de um terreiro no bairro de Pirajá, em Salvador.

Para a desembargadora, a tipificação do crime de racismo e a entrada em vigor do Estatuto da Igualdade Raciail são sinais de progresso da Justiça brasileira, mas a exclusão, sobretudo econômica, permanece.

Cotas – “É preciso dar oportunidades a quem nunca teve”, diz a magistrada, favorável às cotas para o ingresso em universidades públicas. “Precisamos de mais profissionais negros qualificados. Quero mostrar ao meu povo negro que nós, pretos, pobres e periféricos, também podemos ocupar os postos mais altos do país.”

Luislinda conta que a agressão do professor racista, na escola primária, não foi a única. “Mesmo na faculdade, passei por muito achincalhamento por ser negra e pobre”, diz Luislinda, que cursou Filosofia e Teatro, antes de entrar na Faculdade Católica do Salvador (UCSAL), com crédito educativo. O depoimento de Luislinda sobre sua história foi exibido na novela “Páginas da Vida”, da rede globo.
A discriminação não cessou após a formatura. “Quando passei no concurso nacional da procuradoria do DNER (antigo Departamento Nacional de Estradas e Rodagens), em primeiro lugar, fui ‘convidada’ a ceder a vaga em Salvador, minha cidade. Curitiba me acolheu”, conta.

Família – A tristeza passa ao falar sobre a família. Luislinda não esconde o orgulho ao falar do único filho, promotor de Justiça em Sergipe, e dos irmãos, que seguiram seu conselho e seu exemplo nos estudos. “Quanto eu tinha 14 anos, minha mãe morreu. Criei meus três irmãos menores, todos honestos e trabalhadores”, diz Luislinda.

A magistrada se emociona ao lembrar-se do fascínio do pai, já idoso, diante da primeira casa de bloco da família, conquistada quando ela e o segundo irmão já tinham empregos com carteira assinada: “Meus filhos, acabou a miséria nessa casa!”.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Ano Novo com os Orixás*

*por Drª. Elena Andrei

Que a irreverência e o desprendimento de Exú te animem a não encarar as coisas da forma como elas parecem à primeira vista e sim que vc aprenda que tudo na vida, por pior que seja, terá sempre o seu lado bom e proveitoso! 
Laro Yê Exu! 

Que a tenacidade de Ogum te inspire a viver com determinação, sem que vc se intimide com pedras, espinhos e trevas. Sua espada e sua lança desobstruam teu caminho e teu escudo te defenda. 
Ogum Yê meu Pai! 

Que o labor de Oxossi te estimule a conquistar sucesso e fartura às custas de teu próprio esforço. Suas flechas caiam à tua frente, às tuas costas, à tua direita e à tua esquerda, cercando-te para que nenhum mal te atinja. 
Okê Arô Ode! 

Que as folhas de Ossanhe forneçam o bálsamo revitalizante que restaure as tuas energias, mantendo tua mente sã e corpo são. 
Ewe Ossanhe. 

Que Oxum te dê a serenidade para agir de forma consciente e equilibrada. Tal como suas águas doces - que seguem desbravadoras no curso de um rio, entrecortando pedras e se precipitando numa cachoeira, sem parar nem ter como voltar atrás, apenas seguindo para encontrar o mar - assim seja que vc 
possa lutar por um objetivo sem arrependimentos. 
Ora YeYêo Oxum! 

Que o arco-íris de Oxumaré transporte para o infinito tuas orações, sonhos e anseios, e que te traga as respostas divinas, de acordo com teu merecimento. 
Arrobobo Oxumaré! 

Que os raios de Yansã alumiem teu caminho e o turbilhão de seus ventos leve para longe aqueles que de ti se aproximam com o intuito de se aproveitarem de tuas fraquezas. 
Êpa Hey Oyá! 

Que as pedreiras de Xangô sejam a consolidação da Lei Divina em teu coração. Seu machado pese sobre tua cabeça agindo na consciência e tua balança te incuta o bom senso. 
Caô! Caô Cabecilê! 

Que as ondas de Yemanjá te descarreguem, levando para as profundezas do mar sagrado as aflições do dia-a-dia, dando-te a oportunidade de sepultar definitivamente aquilo que te causa dor e que seu seio materno te acolha e te console. 
Odoyá Yemanjá! 

Que as cabaças de Obaluayê tragam não só a cura de tuas mazelas corporais, como também ajudem teu espírito a se despojar das vicissitudes. 
Atotô Obaluayê! 

Que a sabedoria de Nanã te dê uma outra perspectiva de vida, mostrando que cada nova existência que tens, seja aqui na Terra ou em outros mundos, gera a bagagem que te dá meios para atingir a evolução, e não uma forma de punição sem fim como julgam os insensatos. 
Saluba Nanã! 

Que a vitalidade dos Ibeijis te estimule a enfrentar os dissabores como aprendizado; que tu não percas a pureza mesmo que, ao teu redor, a tentação te envolva. Que a inocência não signifique fraqueza, mas sim refinamento moral! 
Onibeijada! 

Que a paz de Oxalá renove tuas esperanças de que, depois de erros e acertos; tristezas e alegrias; derrotas e vitórias; chegara ao teu objetivo mais nobre; aos pés de Zambi maior! 
Êpa Babá Oxalá.

Que os orixás te proporcionem as realizações não alcançadas neste ano, mas que o próximo seja de muita paz, amor, obstáculos vencidos e sonhos realizados. Um Feliz Ano Novo

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Editora causa polêmica nos EUA ao anunciar que cortará termos racistas em livros de Mark Twain

Do UOL Notícias*
 
Uma editora dos Estados Unidos afirmou que pretende lançar uma nova versão de dois livros clássicos de Mark Twain (1835 - 1910) com texto diferente do texto original escrito pelo autor, desatando uma polêmica literária no país.
A proposta da NewSouth Books é eliminar todas as menções às palavras “nigger” e “injun”, dois termos vulgares que se referem a negros e índios, respectivamente, em uma nova edição conjunta de “As Aventuras de Huckleberry Finn” e “As Aventuras de Tom Sawyer”.
“Nigger” aparece mais de 200 vezes em todo o texto, segundo a “Publishers Weekly”, publicação especializada que trouxe a polêmica à tona, e por causa de seu teor racista seria substituída por “slave” – escravo – em todas as vezes. "Injun" será trocada por "índio".
Por causa dos termos, o clássico esteve afastado dos currículos escolares nos EUA, e poderia ser reabilitado em sua versão politicamente correta. Para os críticos, a medida é uma censura à obra.
"Em uma radical diferenciação das edições padrão, os livros mais famosos de Twain são publicados aqui como a narrativa contínua que o autor planejava originalmente. Mais controversa será a decisão do editor, respeitado estudiosos de Mark Twain, Alan Gribben, de eliminar os termos raciais pejorativos que Twain utilizou em seu esforço de escrever de modo realista sobre a atitude social dos anos 1840", anuncia a editora em seu site oficial. "Gribben aponta que dezenas de outras edições atualmente oferecem as inflamadas palavras, mas sua presença tem gradualmente diminuído a audiência potencial para duas das obras-primas de Twain".
Para o estudioso, "as duas histórias podem ser apreciadas profundamente e autenticamente sem os contínuos encontros com as centenas de hoje indefensáveis gírias racistas".
"Mark Twain House & Museum", o principal museu dedicado ao autor nos EUA, já informou que defende a versão original do texto.
"Embora admiremos a pesquisa do dr. Alan Gribben e compartilhemos seu desejo de tornar o livro amplamente acessível em escolas, encorajamos os leitores a experimentar o texto original de Mark Twain sempre que possível", afirmou o diretor do museu, Jeffrey Nichols.
"Nosso departamento de educação trabalha ativamente com escolas em todo o país para contextualizar as problemáticas relações raciais e uso da palavra com 'n' durante o período de vida de Twain. Convidamos os professores a entrarem em contato conosco se querem assistência em como integrar o texto em seus currículos de modo socialmente e historicamente responsável", acrescentou.