sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

BA: Niemeyer homenageou Marighella e terreiro de Candomblé

Pouca gente sabe, mas é no Quinta dos Lázaros, cemitério popular de Salvador, que está exposta uma das duas obras que o arquiteto Oscar Niemeyer, morto na última quarta-feira (5/11), tem na Bahia. Lá, em meio a uma imensidão de sepulturas, qualquer funcionário sabe apontar com precisão uma das lápides mais ilustres do local: “A de Marighella? É aquela, logo ali na frente”, indica o vigia.
Comunista declarado, Niemeyer desenhou o túmulo do também comunista Carlos Marighella (1911-1969), guerrilheiro baiano morto por militares, durante uma emboscada, em São Paulo. O projeto foi um presente à família de Marighella, que era um dos símbolos da luta contra a Ditadura Militar (1964-1985), e foi posto em prática no momento que os restos mortais do guerrilheiro chegaram à Bahia, em 10 de dezembro de 1979, dia internacional dos Direitos Humanos.

No trabalho, há um desenho da silhueta de Marighella, que aparece com o braço direito erguido, em alusão à luta. Além disso, estão inscritos os dizeres: “Não tive tempo para ter medo”. Na próxima segunda-feira (10), data de aniversário da vinda da ossada do comunista para a capital baiana, os familiares e admiradores farão uma visita ao túmulo, ritual que já se tornou uma tradição.

Ironia ou não, a morte de Oscar Niemeyer coincide com a data de nascimento do homem para quem ele desenhou a lápide. Também na última quarta-feira, Marighella completaria, se vivo, 101 anos.

Além do Quinta dos Lázaros, o outro local que possui uma obra assinada pelo arquiteto morto, em Salvador, é o Terreiro de Candomblé Casa Branca (Ilê Axé Iyá Nassô Oká), localizado na Avenida Vasco da Gama. A Praça de Oxum, que fica logo na entrada do terreiro, que é o primeiro do Brasil, foi projetada por Niemeyer, na década de 1980, de acordo com o Ogã Léo, o mais antigo de lá.

O Casa Branca surgiu em 1735, primeiro na Barroquinha, no Centro da cidade, e chegou na Vasco da Gama em 1885. Desde o início, sofria perseguições e, na década de 1970, teve o território tomado para a construção de um posto de gasolina. Nesse momento, os movimentos sociais e os artistas e intelectuais, como Pierre Verger, Timóteo Anastácio, lutaram para reconquistar o espaço e venceram.

O trabalho de Niemeyer, que também foi um presente, começou a ser executado no período de retomada do terreiro, e a inauguração da praça aconteceu em 1993. Uma das partes da praça que mais chamam a atenção é um espelho d’àgua, que abriga uma escultura de Yemanjá, pois a sua estrutura traz a principal marca do arquiteto: as curvas.

“Nós nos sentimos muito orgulhosos por ele [Niemeyer] ter se lembrado do nosso terreiro porque, no passado, não éramos valorizados. Mesmo assim, ele se lembrou da gente”, conta Léo.

O Ogã acredita que, a partir de agora, a visitação no terreiro deve aumentar, depois da morte do arquiteto. “Pouca gente sabe que temos esse pedaço de Niemeyer aqui. Sempre visitam pela parte espiritual, pelo axé, mas com essa divulgação, espero que venham também conhecer a nossa praça”, finaliza.
 

publicado: vermelho.org.br
De Salvador,
Erikson Walla

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