terça-feira, 23 de novembro de 2010

Carta dos Marinheiros - 100 anos da Revolta da Chibata

 *por Franklin Martins
Em novembro de 1910, os marinheiros dos couraçados Minas Gerais e São Paulo, sob o comando de João Cândido, revoltaram-se contra os maus-tratos de que eram vítimas, assumiram o controle dos dois navios e ameaçaram bombardear o Rio de Janeiro se suas reivindicações não fosse atendidas. Para abrir as negociações, enviaram a carta que se segue ao presidente da República, Hermes da Fonseca. O governo dispôs-se a perdoar os cabeças do movimento e estudar a abolição dos castigos na Armada, se os navios fossem entregues aos oficiais. Os revoltosos toparam, mas o governo não cumpriu sua promessa. Cerca de 600 marinheiros foram presos; a maioria deles, enviada para a Amazônia, não sobreviveu muito tempo. Uma exceção foi João Cândido, batizado de “Almirante Negro”, que viveria até bem tarde. Chegou a ser homenageado, em vida, pelos marinheiros e fuzileiros sublevados em 1964.

Rio de Janeiro, 22 de novembro de 1910

Il.mo e Ex.mo Sr. Presidente da República Brasileira

Cumpre-nos comunicar a V. Ex.a, como Chefe da Nação brasileira:

Nós, marinheiros, cidadãos brasileiros e republicanos, não podendo mais suportar a escravidão na Marinha brasileira, a falta de proteção que a Pátria nos dá; e até então não nos chegou; rompemos o negro véu que nos cobria aos olhos do patriótico e enganado povo.
Achando-se todos os navios em nosso poder, tendo a seu bordo prisioneiros todos os oficiais, os quais têm sido os causadores da Marinha brasileira não ser grandiosa, porque durante vinte anos de República ainda não foi bastante para tratar-nos como cidadãos fardados em defesa da Pátria, mandamos esta honrada mensagem para que V. Ex.a faça aos marinheiros brasileiros possuirmos os direitos sagrados que as leis da República nos facilita, acabando com a desordem e nos dando outros gozos que venham engrandecer a Marinha brasileira; bem assim como: retirar os oficiais incompetentes e indignos de servir à Nação brasileira. Reformar o código imoral e vergonhoso que nos rege, a fim de que desapareça a chibata, o bolo e outros castigos semelhantes; aumentar o nosso soldo pelos últimos planos do ilustre Senador José Carlos de Carvalho, educar os marinheiros que não têm competência para vestir a orgulhosa farda, mandar pôr em vigor a tabela de serviço diário, que a acompanha.
Tem V. Ex.a o prazo de 12 horas para mandar-nos a resposta satisfatória, sob pena de ver a Pátria aniquilada.

Bordo do encouraçado São Paulo, em 22 de novembro de 1910.

Nota: Não poderá ser interrompida a ida e volta do mensageiro.

 

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