A manhã de sábado (18) foi surpreendente para a equipe já acostumada com a rotina. Logo na chegada da técnica e do fotógrafo responsáveis pelo Laudo, conheceram uma amante do cinema.
A jovem negra de 22 anos chamada Aline Fernanda não apenas curte assistir ou ler sobre o cinema, mas, sobretudo produzir cinema. Sua paixão começou quando foi campeã de um concurso de redação do município de Tibagi. Aline relata que sempre gostou muito de escrever, mas foi a partir daquela conquista que sentiu-se realmente motivada. “O premio foi um curso de cinema que durou quatro meses. Cheguei a gravar um curta [metragem]. Me apaixonei e agora vivo escrevendo alguma coisa”, declara.
Seria muito legal contar essa história se ela não tivesse o “outro lado”. Apesar do talento e da premiação, Aline Fernanda continua no anonimato. As oportunidades não chegam até o Assentamento onde mora, e ela não tem incentivos para seguir em frente na busca da realização do seu sonho: trabalhar profissionalmente com o cinema.
Ela relata que já produziu algumas peças de teatro, e que sempre está escrevendo alguma coisa. “Não tenho um direcionamento, escrevo sobre o que me dá na telha, sobre aquilo que me incomoda, mas também posso escrever sobre o que você quiser. É só pedir”. O grande problema é que estes trabalhos tornam-se calço de computador, ou arquivo empoeirado.
Depois de mostrar os rascunhos daquilo que escreve cotidianamente, a jovem de voz firme e mãos calejadas pelo trabalho na roça conta, ainda, que também já foi selecionada em concursos de beleza e apenas não engrenou na carreira artística por falta de recursos financeiros. “Fazer books, viajar... É tudo muito caro. A gente daqui não tem como pagar!”, argumenta.
Em Tibagi, 60% da população é negra. Culturalmente, além de possuir o melhor carnaval, é uma das cidades na qual o teatro e melhor desenvolvido. No entanto, a jovem Aline encontra muitas barreiras para crescer profissionalmente. Ela e outros moradores expõem que, apesar da maioria negra, a cidade ainda é bastante elitista. “Alguns tem mais oportunidades que outros, e a gente sempre está fora dos ‘alguns’. A gente não tem dinheiro. Para sair daqui, continuar estudando, precisava ter ajuda”.
A escola mais próxima da comunidade onde vive esta jovem fica a aproximadamente 20 km de distancia. Foi lá que Aline concluiu o ensino médio. Ela pensa em continuar estudando e sonha com a faculdade, mas teria que sair de casa e ir para a cidade para estudar. Isso demandaria custos que a moça não tem como pagar.
Segundo Márcia Regina, irmã da jovem, a comunidade de oito famílias sempre é lembrada por políticos “bem intencionados”, principalmente em época de eleições. “Eles lembram da gente de tempo em tempo e promessa de político não é garantia nenhuma pra nós que já ouvimos tantas e continuamos na mesma situação”, desabafa.
Se este fosse o único caso de talento esquecido pela sociedade e pelo poder público, a solução seria bem menos complicada. Mas o fato é que Aline Fernanda é apenas um dos milhões de outros jovens negros deixados nos cantos deste imenso país para depois. Aquele depois quando a igualdade de tratamento e oportunidade serão os mesmos para o segmento que será chamado Juventude Brasileira, sem divisionismos, sem discriminação. Mas enquanto o depois não chega, Aline e outros milhões vão rascunhando a peça que dramatiza a vida dos jovens negros deste país.
- Texto disponível também no blog unegrojovem.wordpress.com - acesse e confira!
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