Ana Paula Maravalho em 22/8/2006
*artigo atualíssimo.
A revista Veja da semana passada trouxe matéria sobre o recém-lançado livro do jornalista Ali Kamel, diretor-executivo de Jornalismo da TV Globo, Não somos racistas, no qual, segundo o periódico, o autor desbanca, em "análise demolidora", "as falácias da política de cotas raciais" ("Contra o mito da ‘nação bicolor’", pág. 126). Nos gráficos que ilustram a resenha, a revista afirma que "os movimentos que reivindicam cotas no mercado de trabalho para negros dividem a população brasileira em duas raças" (brancos, 52%, e negros, 48%), e em seguida que "o jornalista Ali Kamel observa que esta conta ignora os pardos – os numerosos filhos da miscigenação brasileira. Os números corretos seriam outros: brancos, 52%; negros, 6%; pardos, 42%". A revista repete aqui, pela enésima vez, um expediente falacioso ao qual recorre a cada vez que se posiciona contra as cotas: o de confundir o leitor, ao utilizar, errônea e propositadamente, o termo "negros" para significar "pretos".
Como veículo jornalístico que é, elaborado por profissionais competentes no manejo das informações, e mais ainda, já alertada por leitores atentos às numerosas reincidências no malogro determinado que comete, a revista e seus editores sabem muito bem que "os movimentos que reivindicam cotas" utilizam o termo "negro" para indicar a população formada pela soma de "pretos" e "pardos", que vêm a ser os termos utilizados pelo IBGE para classificar a população afro-descendente no Brasil. Considerando que os efeitos do racismo no Brasil atingem indistintamente estes dois grupos (ao contrário do que supõe a teoria da democracia racial), os movimentos negros (atenção ao plural!), assim como vários pesquisadores de órgãos oficiais no país e membros da academia utilizam o termo "negro" significando a soma dos percentuais relativos aos autodeclarados "pretos" (6% da população brasileira) e "pardos" (42% da população), totalizando 48% de "negros".
O debate em relação às cotas é legítimo e saudável num país em que pouco se discutem os efeitos de um racismo permanente, contundente e cruel com suas vítimas. Ser contra cotas é um ponto de vista, que deve ser respeitado quando vem ao debate com limpeza de propósitos. No entanto, a utilização de argumentos falaciosos como o acima descrito, empregado pela Veja, mais uma vez, com o único objetivo de desinformar e manipular o leitor, revela a pobreza de argumentos de quem procura, desesperadamente, tapar o sol com uma peneira.
Definição de branquitude
O livro de Ali Kamel tem, no entanto, um mérito indiscutível: o de escrever com todas as letras a teoria abraçada pelo diretor-executivo de Jornalismo da TV Globo, que não deve estar longe das diretrizes da própria emissora. E, a julgar pelo entusiasmo do jornalista que escreveu sobre o livro, também é a opinião da revista em questão. A base da teoria é a mesma que embala a nação brasileira desde suas origens: a de que não somos racistas porque somos um país de mestiços. Daí a necessidade de explicar, ou melhor, denunciar que "não há negros no Brasil".
É verdade que a composição racial brasileira não é fácil de explicar. Sem dúvida, a categoria de "negros" não é homogênea. Tampouco a de "brancos", o que leva à constatação de que, ao lado do aparentemente insolúvel problema de "quem é o negro no Brasil", há que se discutir a não menos complicada definição de "quem é o branco no Brasil". Sobretudo quando os argumentos contrários às cotas se concentram na negação da bipolaridade racial.
A definição da branquitude sofreu modificações ao longo de nossa história. Inicialmente reservada aos originários dos países da antiga Europa, os limites do conceito foram se alargando para absorver povos que, em princípio, encontravam-se do lado de lá do perímetro racial. É assim que pessoas que em outros países possuem identidade racial própria (e que sofrem discriminação por esta razão) podem legitimamente – e só no Brasil – reconhecer-se e afirmar-se "brancos". É verdade que, para os descendentes destes povos – judeus, árabes, orientais – a democracia racial funciona perfeitamente. Ainda que preservem valores culturais específicos, a teoria da mestiçagem os absorveu por completo, equiparando-os aos "brancos" em tudo.
Revolta "sincera"
Oposto ao contingente "branco" – real ou virtual – encontra-se sua antítese, o "negro". E aqui também encontramos a influência da teoria da mestiçagem. No Brasil, é negro quem não pode ser considerado branco. A definição é bastante larga para permitir que negros suficientemente claros para cruzar a "linha da cor" possam se autodefinir como brancos. Num país onde ser negro sempre significou estar associado a tudo que é negativo, cruzar a "linha da cor" tornando-se branco é a única alternativa permitida pela idéia da mestiçagem. E é justamente aí que a política de cotas causa uma revolução, ao possibilitar que esta "linha" possa ser cruzada no sentido inverso: tornar-se negro passa a constituir, sim, uma opção de futuro.
Os brancos que se posicionam contrários às cotas o fazem por vários motivos. Entre eles está o de crer, com sinceridade, no mito da democracia racial, na relação harmônica e perfeita entre as diferentes raças em nosso país. É possível, e mesmo provável, que uma pessoa branca creia nisto, sinceramente. Motivos não lhe faltarão: afinal, a questão racial nunca foi uma prioridade em sua vida – nunca foi discriminada por sua cor, e se já discriminou alguém, nem percebeu (contar piadas sobre negros ou repetir alguns "provérbios" oriundos da infinita e sempre correta sabedoria popular não vale, não é? É só brincadeirinha, sem intenção de magoar ninguém!).
Uma pessoa branca poderá viver sua vida inteira sem ser obrigado a definir ou declarar sua branquitude, a não ser no censo. Dificilmente terá passado pela experiência de ter seus erros justificados pela sua cor, ou de ver seus méritos – mesmo que excelentes – serem menosprezados também em função de sua cor. Uma pessoa branca, mesmo pobre, sempre pôde se identificar pela sua cor com os heróis e heroínas de sua infância, fossem eles personagens de um filme, da novela, do livro de História ou mesmo de um livro de historinhas para crianças.
Uma pessoa branca pode, sinceramente, achar que nunca fez distinções entre brancos e negros. Esta nunca foi uma questão importante para ela, até surgirem as discussões sobre cotas para negros na universidade e no mercado de trabalho. A revolta é então, legitimada pelo sentimento de se sentir usurpado em seu sagrado direito à igualdade por um grupelho que, de uma hora para outra, resolveu importar de outras paragens conflitos até então inexistentes no Brasil. Uma pessoa que pense desta maneira pode mesmo estar sendo sincera em sua revolta contra os que advogam que a política de cotas é a única solução para o problema racial brasileiro. Pois, segundo tudo em que acreditam, a verdadeira solução para o sucesso está no esforço pessoal, no mérito. Estão aí para provar todos os negros que alcançaram posição de destaque em suas carreiras: a Glória Maria, a Zezé Mota, o Lázaro Ramos, isso para não falar nos inúmeros cantores e jogadores de futebol negros, que ganham milhões!
Motivo de alerta
O único problema é que, se estamos falando de democracia racial mesmo, não deveríamos poder "identificar" a Glória Maria, a Zezé Mota, o Antônio Pitanga, o Lázaro Ramos, a Deise Nunes (para aqueles que não se lembram, ou não sabem, a nossa única Miss Brasil negra, "eleita" em 1986). E se dermos ainda mais tratos à bola, veremos que entre os exemplos de negros bem-sucedidos há muito poucos no nosso círculo íntimo de amizades. À medida em que subimos os degraus sociais, "muito poucos" vira eufemismo para "nenhum". Pois é muito possível, e mesmo provável, que uma pessoa branca das classes média e alta, no Brasil, atravesse toda a sua vida sem jamais cruzar com pessoas negras no seu círculo social.
E aqui não falo do "álibi negro", aquele que os brasileiros costumam tirar da cartola cada vez que precisam explicar por que não são racistas – aquela empregada que é tratada como se fosse da família, aquele porteiro com quem conversa todos os dias, aquele menino negro a quem sempre dão um trocado no sinal. Falo de pessoas com quem podem se relacionar de igual para igual, com quem tenham estudado no mesmo colégio, com quem dividam, no mesmo nível, um posto no trabalho, com o mesmo salário, o mesmo carro. Tudo bem, vai. Um vizinho no mesmo prédio, na mesma rua, já vale. Ou a médica com quem costumam se consultar. O pediatra dos seus filhos. O dentista. Quantas destas pessoas são negras?
Se os exemplos nacionais e pessoais são tão poucos, já não seria um motivo de alerta de que esta democracia racial não é tão democrática assim? Sim, pois numa democracia racial digna deste nome os negros que teriam "conseguido" seriam tantos que não deveríamos ser capazes de nomear, isolar, apontar "a" exceção que confirma a regra. Que regra? A de que para "conseguir", para "chegar lá", ser branco é um dos requisitos. E ser negro atrapalha.
Discurso e política
A não ser que haja outra explicação. A de que se os negros não conseguem é porque há alguma coisa errada com eles, não com a sociedade. Deve ser porque eles são incapazes, preguiçosos, burros mesmo. Feitos para ser dominados. Geneticamente dotados para a pobreza e o crime. Bingo! Taí a explicação!
O problema com esta explicação é que ela não é, digamos, original. Não é uma decorrência lógica dos fatos, não é uma conclusão a ser tirada da realidade dos negros no Brasil. Na verdade, ela é a própria espinha dorsal do racismo, organizado como doutrina "científica" no século 19 e sistematizado como pedra de toque da concepção de nação brasileira: uma nação mestiça a contragosto, mas que poderia almejar seu lugar ao sol, entre os países civilizados, desde que promovesse o embranquecimento paulatino de sua população. E é a partir desta idéia sistematizada – a da mestiçagem como uma etapa necessária para promover o embranquecimento, de forma a que não haja mais negros no país – que se estabeleceram e se mantêm até hoje as relações raciais por aqui.
O embranquecimento não se resumiu aos discursos dos intelectuais da época, como Sílvio Romero, Oliveira Viana, Nina Rodrigues. Foi mesmo política oficial de governo, como quando o Estado brasileiro promoveu a entrada em massa no país de colonos europeus para ocupar os postos de trabalho liberados a partir da abolição da escravização, pagando a viagem e em muitos casos cedendo terras, insumos e máquinas, ao mesmo tempo em que fechava os portos aos africanos (Decreto 528, de 28 de junho de 1890); ou quando o Itamaraty, em 1921, emitiu ordens explícitas para que as embaixadas brasileiras nos Estados Unidos negassem visto aos afro-americanos que pretendiam comprar terras em Mato Grosso.
Anacrônico e deficiente
O embranquecimento é também a política dominante nos meios de comunicação brasileiros, que conseguiram, pela invisibilização da população negra (pretos e pardos, indistintamente) promover a imagem do país como formado quase 100% por brancos – basta ver as páginas das revistas de moda, de "boa forma" e muitas das novelas e minisséries televisivas.
Diante deste quadro, para não falar nas pesquisas que, desde 1990, vêm mostrando as diferenças abissais entre os índices de desenvolvimento humano de negros e brancos no Brasil, caem todos os argumentos que se posicionam contra as cotas por entenderem que em nosso país não há racismo. Esta discussão já foi superada, inclusive, pelo próprio Estado, que em 1995, sob o comando de Fernando Henrique Cardoso, reconheceu que somos, sim, um país racista. O Estado brasileiro também se comprometeu a empregar os esforços necessários para reduzir o abismo social causado pela discriminação racial histórica no país, em cumprimento aos tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário, e que incluem as ações afirmativas como instrumento de ação legítima contra o racismo.
O livro de Ali Kamel já nasce, portanto, anacrônico e deficiente em seus argumentos. Pode-se ser contrário às cotas por vários motivos. Negar a existência do racismo no Brasil, no entanto, beira o revisionismo.
quinta-feira, 26 de novembro de 2009
quarta-feira, 18 de novembro de 2009
Estados com maioria negra ainda ignoram 20 de Novembro.
S. Paulo - Os três Estados com maior população negra do Brasil – a Bahia (78,8%), na região Nordeste, e Amazonas (78,3%) e Amapá (78%), na região Norte – praticamente ignoram o dia 20 de Novembro – Dia Nacional da Consciência Negra, que lembra a morte de Zumbi dos Palmares, o mitológico líder negro brasileiro declarado herói nacional, com nome inscrito no Panteão da Pátria, em Brasília.
Os dados sobre a presença negra (pretos e pardos) na população dos Estados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).
Cidade africana
Em Salvador, por exemplo, a capital baiana, que tem uma população majoritariamente descendente de africanos, escolhida pelo Governo Federal para as comemorações do 20 de Novembro deste ano, não é feriado municipal.
Na Bahia e no Amazonas em apenas uma cidade o 20 de Novembro foi declarado feriado. Na Bahia, em Itaparica; no Amazonas, o feriado é respeitado na capital, Manaus. No Amapá, em nenhuma cidade a data é lembrada.
Segundo levantamento feito pela Seppir, 435 dos 5.564 municípios brasileiros respeitarão o dia em memória de Zumbi.
Estados
Em três Estados – Rio de Janeiro, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul - o feriado é estadual, ou seja, é respeitado em todos os municípios. No caso do Mato Grosso do Sul, o feriado foi declarado no ano passado e atinge os 77 municípios do Estado.
S. Paulo, que é o Estado com maior população negra do país, em números absolutos – com 12,5 milhões de afro-brasileiros - segundo a Fundação Seade, 97 dos 645 decretaram feriado municipal por iniciativa de suas Câmaras Municipais.
Nos Estados como Piauí, Maranhão e Tocantins, que tem, respectivamente 75,3%, 74,3% e 74,2% de população negra, a data é praticamente ignorada. No Piauí e no Maranhão, ambos na região Nordeste, em nenhum município é feriado, e no Tocantins, na região Norte, dos 139 municípios, a data é lembrada apenas no município de Miracema de Tocantins, com cerca de 26 mil habitantes, segundo o IBGE, e que foi a primeira capital do Estado até 1.990.
Fonte: AfroPress
Os dados sobre a presença negra (pretos e pardos) na população dos Estados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).
Cidade africana
Em Salvador, por exemplo, a capital baiana, que tem uma população majoritariamente descendente de africanos, escolhida pelo Governo Federal para as comemorações do 20 de Novembro deste ano, não é feriado municipal.
Na Bahia e no Amazonas em apenas uma cidade o 20 de Novembro foi declarado feriado. Na Bahia, em Itaparica; no Amazonas, o feriado é respeitado na capital, Manaus. No Amapá, em nenhuma cidade a data é lembrada.
Segundo levantamento feito pela Seppir, 435 dos 5.564 municípios brasileiros respeitarão o dia em memória de Zumbi.
Estados
Em três Estados – Rio de Janeiro, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul - o feriado é estadual, ou seja, é respeitado em todos os municípios. No caso do Mato Grosso do Sul, o feriado foi declarado no ano passado e atinge os 77 municípios do Estado.
S. Paulo, que é o Estado com maior população negra do país, em números absolutos – com 12,5 milhões de afro-brasileiros - segundo a Fundação Seade, 97 dos 645 decretaram feriado municipal por iniciativa de suas Câmaras Municipais.
Nos Estados como Piauí, Maranhão e Tocantins, que tem, respectivamente 75,3%, 74,3% e 74,2% de população negra, a data é praticamente ignorada. No Piauí e no Maranhão, ambos na região Nordeste, em nenhum município é feriado, e no Tocantins, na região Norte, dos 139 municípios, a data é lembrada apenas no município de Miracema de Tocantins, com cerca de 26 mil habitantes, segundo o IBGE, e que foi a primeira capital do Estado até 1.990.
Fonte: AfroPress
segunda-feira, 9 de novembro de 2009
Plano de Qualificação Profissional atenderá 25 mil trabalhadores negros
O maior Plano de Qualificação Profissional com recorte social do Brasil (Planseq) será implantado em 15 estados e no Distrito Federal a partir de 20 de novembro, Dia Nacional da Consciência Negra. Os estados que oferecerão o maior número de vagas para os cursos profissionalizantes serão Minas Gerais (6.945), Rio de Janeiro (3.860) e Mato Grosso (2.940). No total o Planseq Afro – parceria entre o Ministério do Trabalho e Emprego e SEPPIR/ PR – vai contemplar 25 mil trabalhadores negros.
Na prática, o Planseq Afro vai oferecer qualificação profissional para uma cadeia de ofícios dos mercados industrial, comercial e de serviços. As oficinas de ensino profissionalizantes abrangem 14 áreas, tais como operador de telemarketing, eletricista, gerente de supermercado, borracheiro, carpinteiro e costureira. Mas o destaque deste programa é o curso de Cuidador de Pessoas com Doença Falciforme, que prepara mão-de-obra para a patologia que acomete notadamente a população negra.
O maior Planseq com recorte formal é o da construção civil, que beneficia 184 mil pessoas inscritas no Programa Bolsa Família, em 212 municípios de 18 estados brasileiros.
*Comunicação Social da SEPPIR / PR
Na prática, o Planseq Afro vai oferecer qualificação profissional para uma cadeia de ofícios dos mercados industrial, comercial e de serviços. As oficinas de ensino profissionalizantes abrangem 14 áreas, tais como operador de telemarketing, eletricista, gerente de supermercado, borracheiro, carpinteiro e costureira. Mas o destaque deste programa é o curso de Cuidador de Pessoas com Doença Falciforme, que prepara mão-de-obra para a patologia que acomete notadamente a população negra.
O maior Planseq com recorte formal é o da construção civil, que beneficia 184 mil pessoas inscritas no Programa Bolsa Família, em 212 municípios de 18 estados brasileiros.
*Comunicação Social da SEPPIR / PR
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
Inclusão muda perfil de ingressantes na Medicina da USP
Da Agência Estado
Os três melhores colégios particulares do Estado de São Paulo - Vértice, Bandeirantes e Móbile - não tiveram um só aluno entre os aprovados para o curso de medicina da USP (Universidade de São Paulo) neste ano. Já o número de estudantes de escolas públicas convocados para o curso foi recorde das últimas décadas - na USP Pinheiros chegou a 37,7% do total de aprovados.
A medicina tem os candidatos com as notas mais altas e é um dos cursos mais disputados da Fuvest. Para os diretores dos colégios, o programa de inclusão da USP, o Inclusp, seria uma das razões para o resultado deste ano.
Por meio dele, jovens da rede pública recebem até 12% de pontos a mais no vestibular. As três escolas aparecem desde 2006 no topo do ranking do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), único medidor oficial do desempenho de estudantes de escolas privadas do País. Seus alunos chegam a acertar mais de 80% da prova. O quarto no ranking é o Colégio Santa Cruz, que aprovou um aluno na Medicina. Os números foram passados pelos próprios colégios para o Estado. A USP tem pesquisas semelhantes, mas não divulga.
Os dados consideram apenas alunos que terminaram o ensino médio em 2008 e não os que fizeram cursinhos depois de formados nessas escolas. O curso de Medicina na capital, um dos melhores do País, tem 175 vagas. Neste ano, 66 delas (ou 37,7%) foram ocupadas por alunos de escolas públicas. Em 2008, eram 9,7%.
Na primeira fase da Fuvest, a média dos convocados em Medicina foi de 80 acertos (em 90 questões). A USP não mais divulga a nota final dos que foram aprovados, posição que é criticada por alguns donos de colégios. Cada vestibulando recebe apenas seu desempenho em casa. A média geral de aumento da proporção de alunos da rede pública na USP foi de 15% neste ano. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Os três melhores colégios particulares do Estado de São Paulo - Vértice, Bandeirantes e Móbile - não tiveram um só aluno entre os aprovados para o curso de medicina da USP (Universidade de São Paulo) neste ano. Já o número de estudantes de escolas públicas convocados para o curso foi recorde das últimas décadas - na USP Pinheiros chegou a 37,7% do total de aprovados.
A medicina tem os candidatos com as notas mais altas e é um dos cursos mais disputados da Fuvest. Para os diretores dos colégios, o programa de inclusão da USP, o Inclusp, seria uma das razões para o resultado deste ano.
Por meio dele, jovens da rede pública recebem até 12% de pontos a mais no vestibular. As três escolas aparecem desde 2006 no topo do ranking do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), único medidor oficial do desempenho de estudantes de escolas privadas do País. Seus alunos chegam a acertar mais de 80% da prova. O quarto no ranking é o Colégio Santa Cruz, que aprovou um aluno na Medicina. Os números foram passados pelos próprios colégios para o Estado. A USP tem pesquisas semelhantes, mas não divulga.
Os dados consideram apenas alunos que terminaram o ensino médio em 2008 e não os que fizeram cursinhos depois de formados nessas escolas. O curso de Medicina na capital, um dos melhores do País, tem 175 vagas. Neste ano, 66 delas (ou 37,7%) foram ocupadas por alunos de escolas públicas. Em 2008, eram 9,7%.
Na primeira fase da Fuvest, a média dos convocados em Medicina foi de 80 acertos (em 90 questões). A USP não mais divulga a nota final dos que foram aprovados, posição que é criticada por alguns donos de colégios. Cada vestibulando recebe apenas seu desempenho em casa. A média geral de aumento da proporção de alunos da rede pública na USP foi de 15% neste ano. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
Jovem em unidade prisional vence concurso de redação

Um detento surpreendeu o sistema educacional carioca. O interno do Presídio Evaristo de Moraes Leandro Santos Pontes, 27 anos, matriculado na escola prisional Anacleto de Medeiros, venceu o Concurso de Redação Camélia da Liberdade, que contou com a participação de mais de 2 mil alunos das redes pública e privada. A premiação aconteceu nesta terça-feira, no pátio da escola, em São Cristóvão.
O Superintendente Regional da Polícia Federal, Ângelo Gioia, uma das autoridades presentes, confessou na cerimônia: "é a primeira vez que conheço uma unidade prisional onde homens são levados ao conhecimento e a uma nova perspectiva de vida.
O concurso, patrocinado pela Petrobras e organizado pelo Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (Ceap), tinha o tema 100 anos de Sola Trindade, o poeta do povo, evocando um artista do começo do século 20 ligado ao movimento negro. O objetivo era levar os alunos a uma reflexão sobre a questão racial na sociedade brasileira. As redações foram selecionadas pela comissão da Fundação Cesgranrio.
Exemplo para os detentos
Para vencer estudantes de instituições como o Pedro II e o Cefet (Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca), Leandro conta seu segredo: leu cerca de 1,6 mil livros nos últimos 4 anos e 9 meses, período que passou até agora na prisão.
"Eu envio cartas às editoras pedindo doação", afirmou o campeão, frisando que seu livro preferido, fora a Bíblia, é A Cabana (Editora Sextante).
Sua meta após cumprir a pena por assalto - já entrou em semiaberto - é cursar filosofia. "Dentro deste lugar, eu aprendi muito. O colégio tem me ajudado a planejar o futuro e a provar que existe possibilidade de mudança", disse Leandro em seu discurso.
Pelo 1º lugar, ele recebeu um computador e uma impressora, que ficarão, por ora, com sua família. Além disso, a Escola Anacleto Medeiros será premiada com dez computadores, que não poderão ser conectados à Internet por tratar-se de uma prisão. Além disso, a professora de Leandro, Jane Santos, recebeu uma filmadora.
Os dois foram muito aplaudidos pelos detentos presentes na cerimônia, escolhidos pelos professores entre os quase 500 alunos da escola. O presídio inteiro, no entanto, abriga 1,5 mil internos.
Escola é exemplo raro
São 4 mil os alunos no sistema carcerário do Estado do Rio e a escola do Presídio Evaristo de Moraes não é um exemplo representativo da situação do resto do sistema educacional em prisões. Lá, são realizados festivais de música e cinema e existe até mesmo um jornal feito pelos alunos.
"Esta escola é um exemplo para as outras unidades penitenciárias. Agora começamos a ver resultados do trabalho feito aqui", discursou Mario Miranda, membro do conselho penitenciário e professor do instituto.
A freqüência às aulas contribui para a redução da pena dos presos. Cada período de 18 horas em sala de aula representa um dia a menos de reclusão. Em entrevista à revista Ciência Hoje em 2007, o pesquisador Emerson Queluz, da Universidade Federal do Paraná, explicou que o envolvimento dos presos com o ensino costuma ser até maior do que o que normalmente se percebe em alunos de escolas convencionais.
"Esse comportamento pode ser explicado pelo fato de a instituição em que o preso está lhe infligir uma pesada carga disciplinar e também porque o próprio detento costuma ter consciência da importância da escola para sua reinserção na sociedade.
Trechos da redação vencedora
"A história de Francisco Solano Trindade nos leva a uma imagem e aparência verdadeira de um herói que, através das palavras e dos seus poemas e sonhos, nos ensina que, antes de chegarmos à liberdade, precisamos estar e parecer livres."
"Solano Trindade, sendo um homem pós-escravatura, ouviu o grito de sua cor e de sua raça tão humilhada e maltratada até pelas leis abolicionistas. Leis que nunca visaram ao crescimento do povo."
"Com o crescimento e o desenvolvimento das grandes metrópoles, a cultura afro foi sendo afastada das grandes cidades pelos fatores visuais da sociedade. Se Francisco Solano não tivesse morrido em 19 de fevereiro de 1974, ainda estaria recitando o seu poema em tom de protesto e com ar de tristeza: Tem gente com fome."
"Solano, que se empenha em combater o sistema de inferioridade do negro e molda o comportamento como forma de derrubar as barreiras criadas por eles, afirma que a grandeza da fé e da civilização estaria na liberdade."
"(...) Lei do Ventre Livre, Lei dos Sexagenários e a Lei Áurea. Nenhuma dessas Leis determinava que os ex-escravos se tornariam cidadãos brasileiros."
"Acreditou que ser negro não é ser escória ou marginalizado. Ser negro é adquirir cultura, poesia e paixão pela sua cor."
sexta-feira, 2 de outubro de 2009
Imprensa racista

Capa Tribuna do Paraná, 02 de Outubro de 2009.
" SETEMBRO NEGRO:É o que mostra o mapa da violência de Curitba e região metropolitana, nas páginas 16 e 17. Maioria não tem mais de 25 anos. Mês passado foi o pior que agosto até quando o assunto é mulher. Participação delas aumentou 63% nos casos. São mais de cinco crimes por dia e uma vida perdida a cada quatro horas e meia".
A capa ainda trás a foto de uma negra morta com 13 facadas com o seguinte título: "Mata amásia com 13 facadas e é preso por vizinhos".
Logo acima, ainda na capa, uma foto de um jogador de futebol do negro e a seguinte chamada: "Cavalo escaldado vai de ferrolho".
No centro do Jornal a materia: Perigosos na cadeia (na foto detalhe:nenhum negro).
Depois disto só Grabiel Pensador pra expressar a indgnação:
"Não adianta olhar pro céu, com muita fé e pouca luta
Levanta aí que você tem muito protesto pra fazer e muita greve, você pode, você deve, pode crer
Não adianta olhar pro chão, virar a cara pra não ver
Se liga aí que te botaram numa cruz e só porque Jesus sofreu não quer dizer que você tenha que sofrer
Até quando você vai ficar usando rédea?
Rindo da própria tragédia?
Até quando você vai ficar usando rédea? (Pobre, rico, ou classe média).
Até quando você vai levar cascudo mudo?
Muda, muda essa postura
Até quando você vai ficando mudo?
Muda que o medo é um modo de fazer censura.
Até quando você vai levando?
(Porrada! Porrada!)
Até quando vai ficar sem fazer nada?
Até quando você vai levando?
(Porrada! Porrada!)
Até quando vai ser saco de pancada?
Você tenta ser feliz, não vê que é deprimente, seu filho sem escola, seu velho tá sem dente
Cê tenta ser contente e não vê que é revoltante, você tá sem emprego e a sua filha tá gestante
Você se faz de surdo, não vê que é absurdo, você que é inocente foi preso em flagrante!
É tudo flagrante! É tudo flagrante!
Refrão
A polícia matou o estudante, falou que era bandido, chamou de traficante.
A justiça prendeu o pé-rapado, soltou o deputado... e absolveu os PMs de vigário!
Refrão
A polícia só existe pra manter você na lei, lei do silêncio, lei do mais fraco: ou aceita ser um saco de pancada ou vai pro saco.
A programação existe pra manter você na frente, na frente da TV, que é pra te entreter, que é pra você não ver que o programado é você.
Acordo, não tenho trabalho, procuro trabalho, quero trabalhar.
O cara me pede o diploma, não tenho diploma, não pude estudar.
E querem que eu seja educado, que eu ande arrumado, que eu saiba falar
Aquilo que o mundo me pede não é o que o mundo me dá.
Consigo um emprego, começa o emprego, me mato de tanto ralar.
Acordo bem cedo, não tenho sossego nem tempo pra raciocinar.
Não peço arrego, mas onde que eu chego se eu fico no mesmo lugar?
Brinquedo que o filho me pede, não tenho dinheiro pra dar.
Escola, esmola!
Favela, cadeia!
Sem terra, enterra!
Sem renda, se renda!
Não! Não!!
Refrão
Muda, que quando a gente muda o mundo muda com a gente.
A gente muda o mundo na mudança da mente.
E quando a mente muda a gente anda pra frente.
E quando a gente manda ninguém manda na gente.
Na mudança de atitude não há mal que não se mude nem doença sem cura.
Na mudança de postura a gente fica mais seguro, na mudança do presente a gente molda o futuro!
Até quando você vai ficar levando porrada, até quando vai ficar sem fazer nada?
Até quando você vai ficar de saco de pancada?
Até quando você vai levando?"
terça-feira, 29 de setembro de 2009
Os Indiferentes

*por Antonio Gramsci
Odeio os indiferentes. Como Friederich Hebbel acredito que "viver significa tomar partido". Não podem existir os apenas homens, estranhos à cidade. Quem verdadeiramente vive não pode deixar de ser cidadão, e partidário. Indiferença é abulia, parasitismo, covardia, não é vida. Por isso odeio os indiferentes.
A indiferença é o peso morto da história. É a bala de chumbo para o inovador, é a matéria inerte em que se afogam freqüentemente os entusiasmos mais esplendorosos, é o fosso que circunda a velha cidade e a defende melhor do que as mais sólidas muralhas, melhor do que o peito dos seus guerreiros, porque engole nos seus sorvedouros de lama os assaltantes, os dizima e desencoraja e às vezes, os leva a desistir de gesta heróica.
A indiferença atua poderosamente na história. Atua passivamente, mas atua. É a fatalidade; e aquilo com que não se pode contar; é aquilo que confunde os programas, que destrói os planos mesmo os mais bem construídos; é a matéria bruta que se revolta contra a inteligência e a sufoca. O que acontece, o mal que se abate sobre todos, o possível bem que um ato heróico (de valor universal) pode gerar, não se fica a dever tanto à iniciativa dos poucos que atuam quanto à indiferença, ao absentismo dos outros que são muitos. O que acontece, não acontece tanto porque alguns querem que aconteça quanto porque a massa dos homens abdica da sua vontade, deixa fazer, deixa enrolar os nós que, depois, só a espada pode desfazer, deixa promulgar leis que depois só a revolta fará anular, deixa subir ao poder homens que, depois, só uma sublevação poderá derrubar. A fatalidade, que parece dominar a história, não é mais do que a aparência ilusória desta indiferença, deste absentismo. Há fatos que amadurecem na sombra, porque poucas mãos, sem qualquer controle a vigiá-las, tecem a teia da vida coletiva, e a massa não sabe, porque não se preocupa com isso. Os destinos de uma época são manipulados de acordo com visões limitadas e com fins imediatos, de acordo com ambições e paixões pessoais de pequenos grupos ativos, e a massa dos homens não se preocupa com isso. Mas os fatos que amadureceram vêm à superfície; o tecido feito na sombra chega ao seu fim, e então parece ser a fatalidade a arrastar tudo e todos, parece que a história não é mais do que um gigantesco fenômeno natural, uma erupção, um terremoto, de que são todos vítimas, o que quis e o que não quis, quem sabia e quem não sabia, quem se mostrou ativo e quem foi indiferente. Estes então zangam-se, queriam eximir-se às conseqüências, quereriam que se visse que não deram o seu aval, que não são responsáveis. Alguns choramingam piedosamente, outros blasfemam obscenamente, mas nenhum ou poucos põem esta questão: se eu tivesse também cumprido o meu dever, se tivesse procurado fazer valer a minha vontade, o meu parecer, teria sucedido o que sucedeu? Mas nenhum ou poucos atribuem à sua indiferença, ao seu cepticismo, ao fato de não ter dado o seu braço e a sua atividade àqueles grupos de cidadãos que, precisamente para evitarem esse mal combatiam (com o propósito) de procurar o tal bem (que) pretendiam.
A maior parte deles, porém, perante fatos consumados prefere falar de insucessos ideais, de programas definitivamente desmoronados e de outras brincadeiras semelhantes. Recomeçam assim a falta de qualquer responsabilidade. E não por não verem claramente as coisas, e, por vezes, não serem capazes de perspectivar excelentes soluções para os problemas mais urgentes, ou para aqueles que, embora requerendo uma ampla preparação e tempo, são todavia igualmente urgentes. Mas essas soluções são belissimamente infecundas; mas esse contributo para a vida coletiva não é animado por qualquer luz moral; é produto da curiosidade intelectual, não do pungente sentido de uma responsabilidade histórica que quer que todos sejam ativos na vida, que não admite agnosticismos e indiferenças de nenhum gênero.
Odeio os indiferentes também, porque me provocam tédio as suas lamúrias de eternos inocentes. Peço contas a todos eles pela maneira como cumpriram a tarefa que a vida lhes impôs e impõe quotidianamente, do que fizeram e sobretudo do que não fizeram. E sinto que posso ser inexorável, que não devo desperdiçar a minha compaixão, que não posso repartir com eles as minhas lágrimas. Sou militante, estou vivo, sinto nas consciências viris dos que estão comigo pulsar a atividade da cidade futura que estamos a construir. Nessa cidade, a cadeia social não pesará sobre um número reduzido, qualquer coisa que aconteça nela não será devido ao acaso, à fatalidade, mas sim à inteligência dos cidadãos. Ninguém estará à janela a olhar enquanto um pequeno grupo se sacrifica, se imola no sacrifício. E não haverá quem esteja à janela emboscado, e que pretenda usufruir do pouco bem que a atividade de um pequeno grupo tenta realizar e afogue a sua desilusão vituperando o sacrificado, porque não conseguiu o seu intento.
Vivo, sou militante. Por isso odeio quem não toma partido, odeio os indiferentes.
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